Aquele frio nos pés pode significar um risco para idosos!

E se alguém lhe dissesse que ter os pés aquecidos, além de confortável, pode também ser bom para a propriocepção?

O Grupo de Pesquisa em Neuromecânica Aplicada (GNAP) da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) vem dedicando esforços para investigar uma estratégia de intervenção de baixo custo que possa ajudar a melhorar o controle postural de idosos. Controle postural é um termo genérico que descreve os mecanismos que humanos usam no dia a dia para manter posturas estáveis, como a postura em pé, tão importante para diversas atividades do dia a dia. Isso envolve uma série de mecanismos fisiológicos para ser mantida com o mínimo esforço neuromuscular e a máxima eficiência mecânica. Esse tema é relevante porque déficits de controle postural são preditores de quedas em idosos. As quedas são um problema de saúde pública, e para idosos, um dos principais fatores causando dependência. Um dos fatores de risco para esses idosos é a perda de sensibilidade tátil nos pés. Nos estudos mais recentes desenvolvidos pelo GNAP, que contam com a colaboração da Chemnitz University of Technology, da Alemanha, os cientistas investigam se manipular a temperatura dos pés para causar aquecimento pode ser um fator relevante para uma intervenção que melhore aspectos da propriocepção, refletindo quem sabe em melhor controle postural, além do conforto.

O processo de envelhecimento se associa à diminuição da sensibilidade da pele nos pés e uma redução na capacidade de controle postural. Com isso, mesmo pequenas oscilações corporais na postura em pé e que causam demandas de produção de força não conseguem ser cumpridas. A elevação da temperatura nos pés pode beneficiar a sensibilidade da pele e os componentes de propriocepção que também contribuem para o controle da estabilidade em adultos mais jovens. Isso foi demonstrado em um dos estudos publicados pelo grupo algum tempo atrás em um artigo científico publicado na revista The Foot (acesse o artigo aqui) em que o controle postural de jovens que tiveram os pés aquecidos melhorou. Contudo, permanece incerto se esses mesmos efeitos se aplicam a pessoas mais velhas. Em outra recente publicação do grupo de pesquisa, o objetivo foi investigar se o aquecimento dos pés poderia aprimorar o equilíbrio em adultos mais velhos, seguindo observações previamente feitas em adultos mais jovens. Esse artigo foi publicado na revista científica Gait and Posture, uma das principais revistas científicas da área. O artigo pode ser acessado neste link.

O estudo utilizou dois métodos para aquecer os pés de 18 idosos (14 mulheres e 4 homens). O primeiro método consistiu em aquecer a parte inferior dos pés (planta), enquanto o segundo aqueceu toda a área do pé e tornozelo (planta, dorso e tornozelo) usando radiação infravermelha. A radiação infravermelho é um método seguro para promover o aquecimento dos tecidos. Antes e depois do aquecimento, a sensibilidade da pele dos pés foi avaliada por meio de testes de estimulação tátil, juntamente com a medição do deslocamento do centro de pressão (CoP), que permite estimar a oscilação corporal. enquanto os participantes ficavam na postura em pé por 30 segundos, com os olhos abertos e depois fechados.

Estes estudos envolveram coletas dados feitas em 2019, antes da pandemia de COVID-19, e fazem parte de um projeto amplo, com fomento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), com bolsas para estudantes, e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES) e Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD), que fomentou intercâmbios entre o Brasil e Alemanha.

A sensibilidade plantar foi avaliada empregando um teste c línico bastante empregado na prática profissional de fisioterapeutas e demais profissionais atuando na geriatria, em que a sensibilidade tátil é avaliada com o uso de monofilamentos de nylon com diferentes resistências.

As medidas para avaliação do controle postural foram feitas com uma plataforma de força que mede as forças aplicadas ao solo enquanto a postura é mantida.

Todos os dados foram submetidos a análises estatísticas.

Como discutido no artigo publicado, ambos os métodos de aquecimento dos pés aumentaram a temperatura da pele em aproximadamente 6 ºC. Esse aquecimento está de acordo com as normas técnicas de conforto e segurança propostas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas. O aquecimento de toda a área do pé e do tornozelo resultou em efeitos maiores, com aumento na sensibilidade tátil em várias regiões do pé, gerando um efeito positivo em aspectos da propriocepção. A melhora na propriocepção refletiu melhor sensibilidade tátil. Essa melhor sensibilidade tem implicações diversas, como por exemplo, a capacidade dos idosos perceberem desconfortos, pontos de maior pressão nos pés, e até mesmo perceber lesões cutâneas que muitas vezes repercutem em dores e desconfortos ao usar calçados, por exemplo.

Os efeitos do aquecimento dos pés sobre as medidas de controle postural foram um pouco inconclusivas. Isso instigou os cientistas a preparar um novo experimento com o objetivo de investigar se idosos com déficits de controle postural podem se beneficar mais, assim como se essa melhora na propriocepção também pode reduzir níveis de dor sentidas nos pés. Por hora, os cientistas podem afirmar que o protocolo proposto melhora a sensiblidade tátil dos pés, o que por sí só já reflete muitos benefícios para idosos.

Para a realização do estudo, os cientistas utilizaram os seguintes equipamentos no Laboratório de Neuromecânica da UNIPAMPA:

  1. Lâmpadas de Radiação Infravermelha: Para aquecer a região estudada, foram empregadas lâmpadas de radiação infravermelha, que permitem manipular o aumento da temperatura de acordo com o desejado.
  2. Monofilamentos: Estes pequenos dispositivos de nylon foram utilizados para realizar estímulos táteis na pele dos participantes. Ao tocar a pele, eles geram estímulos táteis que são percebidos pelas pessoas, desempenhando um papel fundamental nos testes sensoriais realizados.
  3. Câmera Termográfica: Uma câmera termográfica foi empregada para medir as mudanças na temperatura da pele região em análise. Esse dispositivo permitiu uma avaliação precisa do aumento de temperatura decorrente da aplicação das lâmpadas de radiação infravermelha.
  4. Plataforma de Força: Para avaliar o controle postural, foi utilizada uma plataforma de força posicionada no nível do solo. Esta plataforma possibilitou a mensuração precisa do centro de pressão do corpo dos participantes enquanto eles permaneciam em pé.

Texto preparado e editado por:

  • João Vitor Barbat Barros – estudante de ensino médio no IFRS Uruguaiana e bolsista CNPq de Ensino Médio junto ao GNAP UNIPAMPA
  • Mathias Sosa Machado – Fisioterapeuta graduado pela UNIPAMPA e mestrando em ciências fisiológicas na mesma instituição.
  • Felipe P Carpes – Professor Associado na UNIPAMPA, Doutor em Ciências do Movimento Humano.