por Nelson Mario Victoria Bariani
Agradecido pelo carinhoso convite para escrever nesta coluna. Começo refletindo que, tendo tido a sorte de ser filho de professores, fui direcionado a ter gosto pelo estudo e por essa profissão desde cedo. Meu pai, engenheiro agrônomo, partiu logo em ato de serviço, mas deixou um legado de ações na busca por uma sociedade melhor.
Somadas às circunstâncias da vida e à convicção materna, antes de conseguir sequer pensar no assunto iniciei como professor de inglês num instituto particular aos 17 anos, no mesmo ano em que comecei a graduação em Química. A vocação docente me encontrou e nunca mais me deixou. Fiquei encantado com o tanto que aprendi estando na função de professor, que ainda era um meio de sustento pessoal, e decidi, aos 20 anos, fundar um cursinho de física, química, matemática e inglês na garagem da minha vizinha. Deu certo e foi a minha principal fonte de sustento até os 27 anos, quando passei meus alunos particulares para um colega recém formado em Engenharia Químico, mas ainda sem emprego. Foi aí, nas aulas particulares, onde aconteceu, num mágico dia, a percepção de que aqueles conhecimentos, previamente isolados em compartimentos diferentes da minha cabeça, se conectavam entre si!
Meu amor pelas ciências ficou estabelecido para sempre. E, por causa disso, tentei com sucesso iniciar minha atuação como docente universitário, que no Uruguai pode ser iniciada ainda na etapa de acadêmico, geralmente a partir do 3o ano. Foi assim que há 34 anos iniciei como docente da Cátedra de Física da Faculdade de Química da UDELAR. Novamente apavorado, da mesma forma que no meu início como professor de inglês, percebendo o tanto que não sabia; mesmo assim fui em frente, encantado com o desafio e o fluxo dos conhecimentos chegando. Ali mesmo, com a sorte a meu favor, consegui também formar parte da primeira geração de mestrandos uruguaios (magister em química), criados por meio de um programa internacional de desenvolvimento da ciência básica. Durante esse mestrado, trabalhei em Cristalografia com RX, o que ampliou meus horizontes, me levando a conhecer cientistas da Argentina e do Brasil.
Empolgado com a Física e a ciência em geral, pulei, anos mais tarde, para o Instituto de Física da Faculdade de Engenharia de Montevidéu, onde conheci um ambiente mais próximo ao que é um departamento científico em países mais desenvolvidos. Continuou aí minha paixão pelo estudo dos sistemas instrumentais de medição, que tive oportunidade de conhecer e trabalhar em aulas de laboratório e, também, na pesquisa.
Pressionado pelo ambiente acadêmico para fazer um doutorado, que ainda não existia no Uruguai, e apoiado pela sorte, consegui fazer uma viagem a dois congressos internacionais de Física, em Cancún, e ainda fiquei 15 dias em um centro de investigação científica no México. Nessa viagem, eu decidiria onde fazer o doutorado, pois o momento internacional era favorável a bolsas e apoios para pós-graduações. Significativamente, quer com colegas de quarto de hotel, no setor de pôsteres ou onde apresentei meu trabalho, os apresentadores que mais me chamaram a atenção eram todos do Instituto de Física da UNICAMP, em Campinas, São Paulo. O resto que eu vi, dos Estados Unidos, Canadá, México e outros lugares do mundo, não me cativou da mesma forma. Lá estava sinalizado meu próximo destino que, coincidentemente, não era a primeira vez que aparecia na minha vida.
Na UNICAMP tive a oportunidade de conhecer e entender o ambiente e o nível da ciência contemporânea, num momento histórico fantástico de maturidade do Instituto de Física, ainda no meio de anos dourados de grandes investimentos e reconhecida produção. No entanto, já no final do terceiro ano de doutorado, tinha percebido que meu conceito romântico de ciência não correspondia com a realidade… Será que a ciência era realmente a solução a todos os problemas, como eu acreditava até então?
Minha busca se ampliou. Veio uma filha para cuidar. Veio um pós-doutorado, agora no Departamento de Saneamento e Ambiente da UNICAMP. Também dediquei mais tempo ao estudo de problemáticas humanas e sociais. Tudo isso me levou, cada vez mais, a uma visão mais integrada, mais interdisciplinar, mais holística da realidade. Gradativamente percebi que os desvios nas interpretações e no uso da ciência eram devidos à imaturidade do ser humano e que o método científico é sim uma bela ferramenta para ser usada para conhecer a verdade, dependendo, para isso, do amadurecimento interior das pessoas. Aprendi que deveria cuidar muito com as minhas decisões para não cair em “tendências científicas”, direcionadas por interesses econômicos muitas vezes contrários ao bem comum.
Nessas alturas, interiormente mais próximo da sociedade brasileira do que a uruguaia, a vida tinha me reservado algumas surpresas. O que seria um retorno obrigatório ao Uruguai (após 8 anos no Brasil), acabou se transformando, por motivos circunstanciais de falta de recursos na universidade uruguaia, numa liberação. Logo em seguida, surgiu a primeira experiência docente no Brasil, quando passei no concurso da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, a UERGS, em Santana do Livramento, em 2004. Ótima experiência, na qual encontrei o apoio das tecnologias da informação e comunicação no ensino, que me continuam acompanhando até hoje. Também conheci a esposa com a qual formaria uma linda família posteriormente.
Finalmente, em 2006, se concretiza a grande possibilidade de desenvolver um trabalho como docente e cientista a longo prazo, tentando aproveitar a formação e as experiências coletadas em outras instituições: entrei como professor na Universidade Federal do Pampa. Desde então, otimamente acolhido na UNIPAMPA Itaqui, onde tenho os melhores colegas e alunos possíveis, e grande apoio institucional, organizei minha atuação em torno de um amplo projeto materializado no Laboratório Interdisciplinar Integrado, LABii (ver imagem ao lado), que reúne boa parte das técnicas científicas de maior relevância que conheci, com potencial para contribuir ao desenvolvimento da nossa sociedade local. Técnicas de medição de variáveis ambientais, agrícolas, industriais ou sociais podem ser desenvolvidas no LABii. Estudos, relatórios, artigos ou pareceres sobre regiões ou processos em andamento podem ser produzidos com base em dados de sensores satelitais. Em suma, o Laboratório realiza estudos relacionados a saneamento básico, agricultura, produção de alimentos, saúde, pesquisas sobre temas de interesse social no âmbito acadêmico fornecido pela UNIPAMPA.
O LABii, o grupo de pesquisa UNIGAIA (Grupo de Ações Interdisciplinares Aplicadas da Unipampa) e três projetos “guarda-chuva” de ensino, pesquisa e extensão, elencados abaixo, formam a estrutura acadêmica base do trabalho em andamento, no qual pessoas interessadas podem ir se agregando gradativamente. Despeço-me, então, agradecendo novamente, e com a esperança de que esta história continue dentro do bem e da paz, contribuindo para um avanço positivo de cada um dos envolvidos e da nossa sociedade em geral.
Projetos em andamento, que amparam as temáticas desenvolvidas:
- TIC-TIC: Ações Curriculares do Laboratório Interdisciplinar e Grupo Unigaia Apoiadas em Tecnologias da Comunicação;
- Pesquisa no Laboratório Interdisciplinar Integrado e grupo UNIGAIA;
- LABii – Laboratório Interdisciplinar Integrado: Proposta de Prestação de Serviços Integrada Curricularmente;
Disciplinas relacionadas:
- Tópicos de laboratório interdisciplinar I e II, em versões para os cursos de Agronomia, Agrimensura, Interdisciplinar em C&T e para a Especialização em Ciências Exatas;
- Sensoriamento Remoto Aplicado ao Monitoramento Agrícola e Ambiental (Agronomia e BICT);
- Física (Agronomia);
- Hidrologia (Agronomia);
- Elementos de Cartografia e Geoprocessamento (Agronomia e Aquicultura).
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Revisão e edição de Walker Douglas Pincerati.