Arquivo da categoria: v. 1 n. 4 (2020)

Um olhar sobre a Interdisciplinaridade no Brasil: uma nova perspectiva para produção científica

Nas últimas décadas, tem crescido o interesse acadêmico pela Interdisciplinaridade; muitas vozes ecoam na reivindicação das práticas interdisciplinares na produção de conhecimento e na formação universitária. Associada a um saber relevante para enfrentar os graves problemas sociais e ambientais, fora dos muros acadêmicos, movimentos sociais e organizações não-governamentais defendem a superação de um cenário de fragmentação do conhecimento (a excessiva divisão disciplinar), tendo como pressuposto a necessidade de leituras interdisciplinares dos processos vivenciados nos sistemas físico-químico-biológicos e nos sistemas sócio-histórico-culturais.

Durante o século XX, observou-se uma hiperesespecialização das disciplinas científicas; surgem novas disciplinas, quando o recorte do objeto de estudo reduz o foco dos cientistas em busca da profundidade do conhecimento. Este processo possibilitou grandes conquistas da ciência, dando a ela um poder de influência sobre as ações na vida cotidiana e nas decisões tomadas pelas sociedades. Passa a povoar o imaginário da sociedade ocidental a figura do cientista cada vez mais especializado, de aventais brancos em seus laboratórios bem equipados.

Não seria contraditório então, falarmos em Interdisciplinaridade? Precisa-se compreender o percurso desta perspectiva que emerge com força na produção de conhecimento 1 (principalmente a partir da década de 1960) e na organização dos sistemas de ensino nos países ditos desenvolvidos. Diante de um conhecimento científico cada vez mais complexo, o qual exige uma formação acadêmica para sua compreensão, observa-se a transformação que gera nas formas de relacionamento entre as pessoas e na organização do trabalho, criando um sentimento de apreensão e de insegurança. Surgem criticas aos impactos ambientais percebidos pela artificialização dos espaços urbanos e rurais, atribuindo-se ao desenvolvimento científico-tecnológico um sentido negativo. È neste contexto que surgem discursos em favor da interdisciplinaridade como uma forma de enfrentamento dos grandes problemas sociais e ambientais, fornecendo potência ao conhecimento científico para aproximar-se da vida dos cidadãos e de suas angústias.

Verifica-se que desde os anos 1950, cientistas de várias áreas de conhecimento, epistemólogos e filósofos da ciência passam a defender a interdisciplinaridade, mas esta permanece marginal nas universidades e nos centros de pesquisa 2 ; no entanto, em vários campos profissionais, como nas chamadas ciências ambientais 3 , o trabalho conjunto entre profissionais de várias áreas de conhecimento passa a ser cada vez mais comum e necessário. No mundo da indústria, esta colaboração entre diferentes formações profissionais é cotidiana e muito antiga. Claude Raynaut 4 nos lembra que o esforço realizado para possibilitar as grandes navegações que fizeram os europeus chegarem aos mais diversos recantos do mundo em seu empreendimento colonizador, somente foi possível com a colaboração entre cartógrafos, astrônomos, engenheiros de construção naval, constituindo a “Escola de Sagres”, um empreendimento interdisciplinar.

A Agricultura até o século XIX, quando da fundação das primeiras escolas de agronomia, somente se viabilizava com um conhecimento sobre solos, plantas e condições ambientais, os quais advinham do fazer cotidiano dos agricultores, criando uma “Agri-cultura”; neste conhecimento, esses diferentes elementos interagiam e se influenciavam em seu comportamento; com a evolução da ciência agronômica, os referidos elementos são alocados em diferentes disciplinas, formando-se especialistas em Solos (inclusive, dividindo-se esse tema entre física do solo, fertilidade do solo, microbiologia do solo, conservação de solos, gerando uma formação acadêmica ultraespecializada); especialistas em fisiologia vegetal, fitopatologia, irrigação e tratos culturais em diferentes áreas (fruticultura, Olericultura, Orizicultura, Forrageiras, Soja, Trigo e tantas outras) são formados para aprofundar um conhecimento fundamental aos engenheiros agrônomos. No entanto, ao enfrentar o desafio da produção agrícola, agindo junto aos agricultores, o diálogo entre essas áreas de conhecimento passa a ser necessário; nada mais se trata de esforços multi e interdisciplinares na formação de engenheiros agrônomos.

Mas, se nas áreas técnicas a superação do enfoque disciplinar sempre foi realidade 5 , no meio acadêmico a interdisciplinaridade sempre encontrou dificuldade de se desenvolver. Nas Universidades e Centros de Pesquisa, ainda se percebe a resistência aos trabalhos interdisciplinares, seja devido à formação disciplinar rígida dos pesquisadores e de sua forma de organização em departamentos ou núcleos disciplinares (e na própria formação de grupos de pesquisa e projetos de cooperação internacional). Outros aspectos destacados por Vasconcelos (2016) são a falta de rigor metodológico e uma falta de um tratamento epistemológico adequado, razões pela qual as práticas interdisciplinares são vistas com desconfiança por parte da comunidade científica.

Observa-se no cotidiano acadêmico que as práticas interdisciplinares precisam romper com uma barreira: a dificuldade de comunicação entre pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento. Para Claude Raynaut, essa dificuldade aumenta quando se busca o diálogo entre o que denomina ciências Humanas (as quais abordam objetos imateriais) e ciências naturais (da materialidade), já que se trata de lógicas diferentes e precisa-se romper com preconceitos de ambos os lados. Neste sentido, visando à formação de espíritos mais abertos a leituras interdisciplinares, surgem os Bacharelados Interdisciplinares no Brasil na década de 1980. Não se trata de formar pessoas com uma formação em diferentes áreas (um saber enciclopédico), mas como melhor habilidade e capacitação para promover o diálogo com diferentes disciplinas científicas.

Outro movimento que fornece um Status acadêmico para a Interdisciplinaridade é a sua inserção no sistema de pós-graduação. Mesmo que desde a década de 1970, a Interdisciplinaridade tenha emergido no Brasil, através de intelectuais que tomaram contato com pesquisadores de centros internacionais, europeus e norte-americanos, permaneceu como marginal na comunidade científica brasileira até anos recentes; somente na virada para o século XXI, a produção de conhecimento interdisciplinar passa a ser reconhecida como importante e estratégica para o sistema de produção de acadêmica com a criação em 1999 da Câmara Interdisciplinar (chamada inicialmente de Comitê Multidisciplinar) pela CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), vinculada ao Ministério de Educação. Esse reconhecimento de cursos de pós-graduação Interdisciplinares, sejam de mestrado sejam de doutorado, contribuiu para o estímulo e a consolidação de grupos de pesquisa interdisciplinares nas Universidades brasileiras.

O crescente interesse despertado na comunidade acadêmica pela Interdisciplinaridade como perspectiva epistemológica com elevado potencial para a produção de conhecimento pode ser observado pelo significativo crescimento dos programas de pós-graduação interdisciplinares. De 19 programas aprovados pela CAPES em 2001, chega-se a 64 em 2008, ano que apresenta o maior número; continua-se um crescimento intenso até 2015 com 48 cursos aprovados, sendo que a partir daí os critérios de avaliação para aprovação se tornam mais rígidos, causando queda no número de propostas aprovadas, segundo relatório da Câmara Interdisciplinar da CAPES (https://www.capes.gov.br/images/Documento_de_%C3%A1rea_2019/INTERDISCIPLINAR.pdf)

Segundo esse documento, produzido em 2019, atualmente existem 368 programas de pós-graduação interdisciplinares recomendados pela CAPES, envolvendo quatro áreas que compõem a Câmara Interdisciplinar: Meio-Ambiente e Agrárias (47/13%), Sociais e Humanidades (148/40), Engenharia, Tecnologia e Gestão (88/24%), Saúde e Biológicas (85/23%). Esses programas dividem-se em Acadêmicos (voltados à produção de conhecimento sobre temas considerados relevantes pela comunidade científica) e Profissionais (mais recentes, surgem com o objetivo de estreitar a relação entre as universidades e os diferentes segmentos da sociedade, voltando-se à qualificação profissional).

No universo de programas de pós-graduação interdisciplinares, dentre os acadêmicos, encontram-se com somente Mestrado (136/37%), com somente Doutorado (12/3%) e com Mestrado e Doutorado (123/33%); dentre os caracterizados como profissionais encontram-se com somente Mestrado (91/25%), com somente Doutorado (2/1%) e com Mestrado e Doutorado (4/1%).

Esse aumento da busca por uma formação interdisciplinar indicaria a necessidade sentida de abordagens interdisciplinares para a atuação de profissionais em uma “realidade híbrida”, a qual caracterizaria para Claude Raynaut (2014), a sociedade contemporânea. Para esse intelectual Francês, Diretor de Pesquisas no Centro de Pesquisas Científicas da França (CNRS) da Universidade de Bordeaux, a formação interdisciplinar atrai acadêmicos mais abertos à colaboração entre diferentes disciplinas. Ele introduz o conceito de Realidade Híbrida definida como uma grande imbricação entre realidades humanas e materiais, quando espaços cada vez mais antropizados exigem o olhar das Ciências Humanas para conhecer as formas de sociabilidade e exigências socioculturais, fundamentos que os modelam; e, por outro lado, as sociedades humanas são cada vez mais dependentes de suas bases geo-bio-físicas, como se percebe na crise ambiental que ameaça a sustentabilidade planetária.

Os autores que escrevem sobre a interdisciplinaridade costumam salientar que existe uma dificuldade de conceituá-la e que são muitos os entendimentos sobre sua forma de operacionalização 6 ; mas também costumam reforçar que diferentes formas de práticas interdisciplinares são cada vez mais frequentes desde a simples colaboração entre disciplinas diante de uma questão pontual, até a integração permanente entre disciplinas, as interdisciplinas, as quais assumem o caráter de nova área de conhecimento com corpos teóricos e métodos consensualmente aceitos.

Também se deve salientar que em campos de conhecimento que tem assumido grande protagonismo acadêmico, nas chamadas ciências de fronteira, como a Neurofisiologia, a Neuroquímica, Biologia Molecular, Biotecnologia, Engenharia Genética, entre outros, sua formação como área de conhecimento surge a partir de esforços interdisciplinares; estes geraram novos conceitos e métodos, formando nova disciplina. Sem dúvida, tem aumentado cada vez mais interesse pela interdisciplinaridade e pela sua adoção como princípio formativo nos sistemas de ensino superior, processo que ganha mais relevância diante das problemáticas graves que vivenciamos na sociedade contemporânea.

Revisado por Cristina dos Santos Lovato

O que aconteceu com o Brasil?

Jonas Anderson Simões das Neves é Professor Adjunto na UNIPAMPA, no Campus de Dom Pedrito. Possui graduação em História – Bacharelado pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande (2004), Especialização em Sociologia pela Universidade Federal de Pelotas (2006), Mestrado em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2009) e Doutorado em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2013). Possui também Pós-Doutorado em Desenvolvimento Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2013). Atualmente, é coordenador do Curso de Educação do Campo – Licenciatura e líder do Grupo de Pesquisa e Extensão em Agricultura Familiar e Sustentabilidade Socioambiental.

O mundo enfrenta uma das maiores pandemias da história, já são mais de 5 milhões de pessoas infectadas pela Covid-19, que fez mais de 342 mil vítimas fatais. A América do Sul é o atual epicentro da doença, especialmente, pelo rápido aumento dos números no Brasil, que possui quase 350 mil casos e mais de 22 mil mortes. Nesses termos, os olhos do mundo se voltam para cá, com especial atenção ao (des)cumprimento das medidas sanitárias recomendadas pela OMS que poderiam conter a propagação do vírus. A questão é que mesmo diante da ascendência da curva de contágio e de mortes no país, o governo brasileiro minimiza o problema, ignora as orientações de autoridades de saúde e os resultados de pesquisas científicas, insistindo na defesa de protocolos infundados e que aumentam o risco à saúde da população.

Desta forma, não foi sem razão que o jornal norte-americano The Washington Post definiu o presidente brasileiro como o pior líder do mundo e que a revista científica britânica The Lancet, umas das principais publicações na área da saúde, classificou Jair Bolsonaro como maior ameaça a luta contra o Coronavírus no país, destacadamente porque tem defendido o isolamento social vertical, restrito ao grupo de risco, ao contrário do que orienta a OMS, de um isolamento horizontal, que inclui todos os grupos populacionais; bem como pela insistência na utilização da Cloroquina no tratamento da doença, num protocolo que foi mantido mesmo após a publicação de estudo científico acerca do uso da droga, pela própria revista The Lancet e que concluiu que além de não ser eficaz no tratamento da Covid-19, o uso do medicamento aumenta o risco de morte.

Ao final deste ano estaremos chegando ao final da segunda década do século XXI, mas ao contrário do que vivenciamos ao final da primeira, o Brasil deixou de ocupar o protagonismo que tinha no cenário internacional, sendo apontado como referência e potencial liderança mundial. Ao final de 2009, a revista britânica The Economist trazia em sua capa uma montagem da imagem do cristo redentor decolando, seguida da seguinte mensagem: “Brazil Takes Off”, em tradução livre, “O Brasil Decola”. Se é verdade que a manchete revelava algum exagero, não era sem razão que recebia aquele destaque, ao longo dos primeiros dez anos deste século o Brasil destacava-se por seu crescimento econômico, revertido em redução da pobreza e diminuição das desigualdades sociais; pela resposta bem sucedida dada à crise econômica mundial de 2008 e por sua liderança entre os BRICS, grupo dos principais países com economias em desenvolvimento.

Neste período, o crescimento econômico brasileiro teve como principal base de sustentação a exploração dos recursos naturais, fundamentalmente a exportação de commodities agrícolas e minerais, revertidas em políticas sociais e em investimentos públicos, principalmente, nas áreas de infraestrutura, pesquisa e educação. A sustentabilidade desse modelo, baseado na ampliação da pressão sobre a natureza, precisa ser questionada; no entanto, é preciso reconhecer que naquele momento houve significativa melhoria da qualidade de vida dos estratos mais pobres da população; ampliou-se o acesso educacional; obras estruturantes foram levadas adiante, mesmo que nem todas concluídas; o capital privado contou com linhas de financiamento altamente favoráveis e o setor público, incluindo as estatais, recebeu significativos investimentos. 

Dentre os resultados desses investimentos no setor público, chamou atenção do mundo a descoberta de uma reserva oceânica de petróleo na costa brasileira, que apenas a Petrobras possuía tecnologia para explorar. Logo após a descoberta do pré-sal, ficou estabelecido que a estatal brasileira seria a única operadora e partícipe obrigatória dos leilões de petróleo, com parte de seus royalties sendo destinados obrigatoriamente para a educação e a saúde. No entanto, grupos econômicos internacionais se articularam para desestabilizar o sistema político e econômico do país e garantir a maior fatia daquelas riquezas, conforme revelou a Organização Transnacional sem fins lucrativos Wikileaks.

Em meio a esse processo, em 2012, se vivenciaria o agravamento da crise econômica mundial de 2008, mas a conjuntura era outra e a resposta também foi; ao invés do investimento em medidas contracíclicas e de fomento à economia, a opção foi por reduzir os investimentos públicos, iniciativa que se mostrou ineficaz e ampliou a crise. Neste cenário, no ano seguinte alguns grupos saem às ruas para protestar contra o aumento das tarifas do transporte coletivo, passando a contar, em seguida, com a simpatia e adesão de outros segmentos insatisfeitos com o governo, mas bastante difusos ideologicamente. Mesmo diante deste cenário de instabilidade e com acusações de corrupção reveladas pela operação lava-jato, Dilma Roussef é reeleita presidente do Brasil, mas não governa e cai, vitimada por um golpe dois anos depois.

Entra em cena então mais um ator decisivo para a derrocada da imagem e das expectativas do mundo em relação ao Brasil, a operação lava-jato. Neste sentido, o problema nunca esteve em seus objetivos e acertos, desvelando um complexo sistema de corrupção articulado internacionalmente e que teve no Brasil um de seus centros de atuação, conforme revelado pelo Panama Papers, mas sim na forma pela qual foi conduzida, com métodos questionáveis de obtenção de provas, acusações nem sempre transparentes e muitos vazamentos e divulgações de informações que interferiram diretamente em processos eleitorais. Conforme indicam informações reveladas pelo Wikileaks, essa operação parece ter nascido como desdobramento do Bridge Project, acordo que previa a troca de experiências entre Brasil e Estados Unidos acerca do combate à corrupção.

O fato é que a recessão econômica associada à fragilidade do governo, diante de manifestações populares contrárias que se multiplicavam com ampla repercussão e respaldo da mídia; aos desdobramentos da operação lava-jato e a própria dificuldade de articulação política do governo não tardaram a resultar num processo de impeachment da presidente. Uma das primeiras ações do novo presidente foi quebrar a prioridade da Petrobras nos leilões de bacias do pré-sal, a partir de projeto do então deputado José Serra, que segundo a Wikeleaks teria trocado telegramas com petroleiras quando candidato a presidência, bem como encaminhar Medida Provisória com isenções à indústria de petróleo até 2040, com valores estimados em mais de 1 trilhão de reais. O governo Temer também ficou marcado por escândalos de corrupção, incluindo um processo de impeachment que não foi levado adiante em troca de cargos no governo e pela grande liberação de recursos para emendas parlamentares; pela aprovação da contrarreforma trabalhista, que destroçou direitos dos trabalhadores; pela tentativa de flexibilizar o trabalho escravo e pelo afrouxamento das legislações ambientais e que facilitaram a exploração estrangeira sobre os recursos naturais brasileiros.

O projeto de quebrar a nascente soberania brasileira do século XXI, quando parecia que finalmente o país estava atingindo sua maioridade enquanto nação independente e colocá-lo de novo sob o big stick norte-americano ganhou força após o golpe, mas atingiu proporções maiores com a eleição de Jair Bolsonaro, que teve sua estratégia de campanha desenhada pelo ex-assessor de Donal Trump, Steve Bannon, retomando-se um alinhamento entre os países semelhante ao período da ditadura militar. O atual governo sempre fez questão de ressaltar sua afeição aos Estados Unidos, mesmo que a recíproca não seja verdadeira, num processo definido pela revista americana Jacobin como “pathetic submissiveness”, em tradução livre, submissão patética.

 Não obstante, o governo tem comprometido ainda mais a imagem e a credibilidade do país com atitudes que beiram ao absurdo, tais como o despreparo demonstrado no discurso de abertura do Fórum Econômico Mundial de Davos; a tentativa do presidente de indicar seu filho, sem qualquer formação, para a embaixada dos Estados Unidos; a negação das queimadas na Amazônia, chegando ao ponto de exonerar o pesquisador responsável pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) por divulgar os dados e acusar, sem qualquer prova, o ator Leonardo Di Caprio pelas queimadas; a tentativa de culpar a Venezuela, também sem provas, pelo vazamento de óleo em praias brasileiras; as supostas tentativas de intervenção em órgãos do judiciário; as já referidas atitudes diante da pandemia de Covid-19; entre outras tantas.

Mas, afinal, o que aconteceu com o Brasil? Ao final da década passada o governo brasileiro figurava entre as principais lideranças do mundo, o país era referência por suas políticas sociais e protagonismo econômico; atualmente, mesmo antes dos efeitos da pandemia, a economia brasileira se arrastava; as taxas de desemprego permaneciam altas; a instabilidade política desencorajava investidores; a fome e a pobreza extrema voltavam; doenças quase extintas circulavam novamente por falta de vacinação; a educação minguava diante dos cortes de recursos, enfim, os retrocessos reverberavam por todas as áreas. Mas, ao contrário do que muitos podem pensar, o que houve não foi a falência de um projeto de soberania nacional que começou a ser gestado no início deste século, mas sim o sucesso de um outro projeto, que se beneficia da pobreza, do caos e da morte, mas esse é um assunto para outra conversa.

Revisado por Cristina dos Santos Lovato

Contribuição da Universidade Federal do Pampa Campus Itaqui-RS no Combate a COVID -19

Pesquisa denominada Percepção da população de itaqui (rs) sobre a pandemia de coronavírus (covid-19) busca investigar o que a população de Itaqui (RS) conhece sobre a pandemia de Coronavírus (Covid-19). Pretende-se, com base no conhecimento do comportamento da população em estudo, implementar futuras ações sociais e campanhas educacionais em saúde pública no município, as quais deverão obter um maior engajamento dos munícipes. 

Graciéle Pereira Souza, graduanda do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia (http://lattes.cnpq.br/0578594221593657). Membro da Equipe do Jornal Interdisciplinar em C & T. E-mail:souzasgra@gmail.com

O projeto é desenvolvido por uma equipe coordenada pela professora Luciana Ethur e o técnico-administrativo Felipe B. Ethur, com a participação dos discentes Kellen R. Carlosso, Dieison M. da Silva, Kalita M. L. Fresingheli, Bruna Z. dos Santos, Letícia da R. Nunes, Taináh Espinosa e Thalles F. Fagundes.

Segundo a coordenadora do projeto, o instrumento de pesquisa utilizado foi um questionário com 22 questões, referentes ao perfil do entrevistado, mídia utilizada para informação, conhecimento sobre o vírus, fatores econômicos e sociais, percepção de risco e perigo da pandemia e comportamento frente à situação atual. Esse questionário foi aplicado via google drive, obtendo-se um total de 491 respostas/entrevistas, sendo 365 de Itaqui. As respostas estão sendo organizadas, tabuladas e analisadas para serem publicadas e divulgadas para a comunidade.

O momento atual da pesquisa é a escrita e elaboração de textos para publicação dos dados para a comunidade. O trabalho conta com a participação ativa dos discentes de diferentes cursos da UNIPAMPA- Campus de Itaqui, os quais mesmo que a distância, utilizando para reuniões a plataforma Google Meet, além de utilizar-se o Facebook e Instagram como instrumento de comunicação interna e na relação com a comunidade externa.

Essa pesquisa vem de encontro ao plano de desenvolvimento institucional – PDI da UNIPAMPA –, pois está fundamentada na responsabilidade social, a qual consiste em dialogar, intermediar, intervir e buscar soluções alternativas a curto, médio e longo prazo junto a comunidade onde está inserida.

Conforme a professora Luciana Zago Ethur: “A presente pesquisa cumpre esse requisito de preocupação e interação com a comunidade itaquiense, visando identificar carências em uma fase crítica e incerta. Ao objetivar subsidiar futuras ações sociais e campanhas educacionais em saúde pública no município, busca-se contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população, como preconiza o nosso PDI”.

Revisado por Cristina dos Santos Lovato

Contribuição da Universidade Federal do Pampa Campus Itaqui-RS no Combate a COVID -19: Pesquisa denominada “PERCEPÇÃO DA POPULAÇÃO DE ITAQUI (RS) SOBRE A PANDEMIA DE CORONAVÍRUS (COVID-19)”

Este projeto que está em andamento, busca investigar o que a população de Itaqui (RS) conhece sobre a pandemia de Coronavírus (Covid-19); pretende-se, com base no conhecimento do comportamento da população em estudo, implementar futuras ações sociais e campanhas educacionais em saúde pública no município, as quais deverão obter um maior engajamento dos munícipes.

O projeto está sendo desenvolvido por uma equipe coordenada pela professora Luciana Ethur e o técnico-administrativo Felipe B. Ethur, tendo a participação dos discentes Kellen R. Carlosso, Dieison M. da Silva, Kalita M. L. Fresingheli, Bruna Z. dos Santos, Letícia da R. Nunes, Taináh Espinosa e Thalles F. Fagundes.

Segundo a coordenadora do projeto, o instrumento de pesquisa utilizado foi um questionário com 22 questões, referentes ao perfil do entrevistado, mídia utilizada para informação, conhecimento sobre o vírus, fatores econômicos e sociais, percepção de risco e perigo da pandemia e comportamento frente à situação atual. Esse questionário foi aplicado via google drive, obtendo-se um total de 491 respostas/entrevistas, sendo 365 de Itaqui. As respostas estão sendo organizadas, tabuladas e analisadas para serem publicadas e divulgadas para a comunidade.

O momento atual da pesquisa é a escrita e elaboração de textos para publicação dos dados para a comunidade. O trabalho conta com a participação ativa dos discentes de diferentes cursos da UNIPAMPA-Campus de Itaqui, os quais mesmo que a distância, utilizando para reuniões a plataforma google meet, além de utilizar-se o Facebook e Instagram como instrumento de comunicação interna e na relação com a comunidade externa.

Essa pesquisa vem de encontro ao plano de desenvolvimento institucional – PDI da UNIPAMPA, pois está fundamentado na responsabilidade social, a qual consiste em dialogar, intermediar, intervir e buscar soluções alternativas a curto, médio e longo prazo junto a comunidade onde está inserida.

Conforme a professora Luciana Zago Ethur “A presente pesquisa cumpre esse requisito de preocupação e interação com a comunidade itaquiense, visando identificar carências em uma fase crítica e incerta. Ao objetivar subsidiar futuras ações sociais e campanhas educacionais em saúde pública no município, busca-se contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população, como preconiza o nosso PDI”.

Graciéle Pereira Souza
Graduanda Bacharel Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia
http://lattes.cnpq.br/0578594221593657
Membro da Equipe do Jornal Interdisciplinar em C & T

O tempo não para

Fernanda Bonorino é fotografa profissional há oito anos.
Site: www.nanabonorino.com.br Instagram: @nanabonorinofotografia E-mail: contato@nanabonorino.com.br

Eles esperam o jornal toda manhã cedinho, tomam o chimarrão enquanto leem as notícias. Seu José faz o café da manhã para Dona Olga, logo depois de dar a injeção diária que ela precisa. Com mais de 80 anos, os dois cuidam das galinhas e das flores que eles adoram. Nas paredes, toda a história de vidas que eles juntos formaram.

A ideia dessa sessão de fotos foi de uma das filhas do casal e teve a intenção de guardar a vida simples e de cumplicidade que os dois têm há mais de 60 anos. As fotos foram feitas em janeiro de 2020 e no formato de Fotografia documental de família, que é quando documentamos algo buscando mostrar de uma maneira honesta o que estamos fotografando, ou seja, sem interferência, ou melhor, sem muita interferência, tendo em vista que a nossa presença pode contar como algo a intervir mas, isso pode ser assunto pra outro momento.

A sessão foi feita em uma parte da manhã, entre conversas e muitas histórias, eu ia fotografando a rotina deles. Na fotografia de família, sempre busco a conexão de cada família, e como sempre digo: o respeito total por cada história que será contada. Sempre pontuo também que, para tentar buscar a essência de cada família, é necessário, às vezes, deixar a câmera de lado, prestar atenção nas histórias e viver um pouco de tudo aquilo que está sendo fotografado. E já que falamos em câmera, quando se faz referência aos equipamentos usados na fotografia – e há muitos debates sobre isso – não nos limitamos a pensar que somente equipamentos de última geração são capazes de fazer boas fotos. A fotografia que pode ser considerada “boa”, em minha opinião, não está totalmente ligada à técnica, a boa foto está conectada aos sentimentos que ela traz, especialmente, para os personagens das histórias retratadas. É claro que, nós fotógrafos, precisamos nos apropriar das técnicas, buscando a melhor luz, o melhor ângulo e a melhor composição, mas devemos antes de tudo olhar para aquela história de coração aberto. Fotografar com o sentimento.

Essa sessão de fotos, após uma curadoria, resultou em uma coleção de 20 fotografias com a narrativa que conta o cotidiano de um casal que construiu uma família e inúmeras histórias que hoje estão contadas nas paredes da casa e nos álbuns que eles guardam. É incrível para mim poder fazer parte dessa e de tantas outras histórias que eu já contei com o meu trabalho. 

Em fevereiro, tive a honra de ter essa coleção premiada pela Inspiration Photographers, uma associação de fotografia conceituada no mundo inteiro.

Foi um prazer poder ouvir e contar um pouco dessa história de companheirismo e amor para todo o mundo.

A coleção completa está no link abaixo.
https://inspirationphotographers.com/awards/best-family-awards-6/

Revisado por Cristina dos Santos Lovato

Análise geográfica da distribuição dos serviços de saúde de Terapia Intensiva para atendimentos dos casos de COVID-19 no RS

Sidnei Luís Bohn Gass é professor da Universidade Federal do Pampa – Campus Itaqui –, e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFRGS. Coordenador do projeto SIGPampa – sidneigass@unipampa.edu.br – http://orcid.org/0000-0001-5197-7506. Dieison Morozoli da Silva é discente do Curso de Engenharia Cartográfica e de Agrimensura da Universidade Federal do Pampa – Campus Itaqui – dieison.ufp@gmail.com – https://orcid.org/0000-0001-5281-8427

Uma das temáticas que preocupa a sociedade em geral, bem como as autoridades de saúde, é como a disponibilidade do Sistema de Saúde pode atender aos casos da COVID-19. Neste sentido, a Secretaria Estadual da Saúde elaborou o Plano de Contingência Hospitalar – COVID-19 < https://coronavirus.rs.gov.br/plano-de-contingencia>; que contém as informações básicas sobre a temática e mostra de que forma o Estado está se organizando para o enfrentamento da crise. Esse documento é a linha-mestra de ação a ser seguida para o atendimento dos casos.

Buscando compreender como este quadro está geograficamente distribuído, o projeto SIGPampa elaborou uma análise cartográfica dos dados apresentados na versão 9.0, de 07/04/2020, do Plano de Contingência Hospitalar, buscando também os dados disponibilizados através da plataforma DATASUS. O estudo leva em consideração as Macrorregiões de Saúde do estado do Rio Grande do Sul. Cabe salientar que, para fins de organização e gestão da saúde, o território do Rio Grande do Sul está dividido em Macrorregiões, Coordenadorias Regionais de Saúde e Regiões de Saúde, como demonstrado pelo mapa da figura 1. Essa organização considera agrupamentos de municípios, tomando por base a dimensão dos seus territórios e, por conseguinte, as distâncias a serem percorridas.

Figura 1 - Organização da Saúde no território do Estado do Rio Grande do Sul
Figura 1 – Organização da Saúde no território do Estado do Rio Grande do Sul

A partir do Plano de Contingência Hospitalar (SES-RS, 2020), a Secretaria da Saúde traça um panorama de como poderá ocorrer a ampliação dos leitos de UTI para atender especificamente os casos de COVID-19 que necessitem desse tipo de suporte. O Plano prevê que 30% dos leitos de Terapia Intensiva mantidos pelo SUS, existentes, (301 leitos), serão reservados para o atendimento de pacientes da COVID-19. À medida em que os níveis estabelecidos pelo Plano forem avançando, há a previsão da ampliação dos leitos, ou seja, o incremento de leitos novos, para além daqueles disponíveis no sistema de saúde.

Os números absolutos sistematizados pelo projeto SIGPampa, para que tenham uma representatividade dentro daquilo que a Organização Mundial da Saúde estabelece, devem ser relativizados, considerando o quociente relativo a cada 10.000 habitantes. Neste sentido, antes da pandemia da COVID-19, a OMS recomendou que cada país tenha de 1 a 3 leitos de terapia intensiva para cada 10.000 habitantes. De acordo com o comunicado da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB, 2020),

segundo recomendações da OMS e do Ministério da Saúde, a relação ideal de leitos de UTI é de 1 a 3 leitos de UTI para cada 10 mil habitantes. Hoje, o SUS tem 1 leito para cada 10 mil habitantes, com pouca margem para aumento de demandas devido à alta taxa de  ocupação. Na rede particular, a relação é de 4 leitos para cada 10 mil habitantes e a ocupação média é de 80%.

Tomando por base estes quocientes, foi analisada a distribuição dos leitos disponíveis para cada 10.000 habitantes, por Macrorregião de Saúde, nos seguintes casos:

A – número total de leitos de UTI mantidos pelo SUS, antes do início da pandemia;
B – 30% dos leitos de UTI mantidos pelo SUS antes da pandemia, reservados para pacientes de COVID-19, conforme Plano de Contingência Hospitalar (SES-RS, 2020);
C – número total de leitos de UTI não mantidos pelo SUS (particulares);
D – número total de leitos ampliados, considerando o nível 3 do Plano de Contingencia Hospitalar;
E – leitos de UTI mantidos pelo SUS, para cada 10.000 habitantes, antes da pandemia;
F – leitos de UTI mantidos pelo SUS, mais leitos UTI não mantidos pelo SUS, para cada 10.000 habitantes, antes da pandemia;
G – leitos de UTI para cada 10.000 habitantes, considerando os leitos dos grupos B e D;
H – leitos de UTI para cada 10.000 habitantes, considerando os leitos dos grupos B, C e D.

Um elemento que deve ter espaço nas análises que são feitas, não apenas por essa pesquisa, mas, em especial naquelas que se debruçam sobre os protocolos de atendimento da COVID-19 e da gestão do sistema de saúde, é o fato de que

o coronavírus pode ter infectado quatro vezes mais pessoas no Rio Grande do Sul do que indicam os números oficiais. Esta é a projeção da pesquisa coordenada pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), que conta com a participação de pesquisadores da Universidade Federal do Pampa (Unipampa).

A primeira fase do estudo, realizada nos dias 11 e 12 de abril, mostra que para cada caso confirmado existem outros quatro não notificados. De acordo com a análise é de que 5.650 pessoas tenham sido infectadas pelo coronavírus no estado. Nesta quinta-feira, 16 de abril, o número de casos confirmados pela secretaria estadual da saúde não chega a 800. (UNIPAMPA, 2020)

Os dados da referida pesquisa, se associados ao fato de que no estado está ocorrendo a passagem do outono para o inverno, pode trazer à lume outra preocupação, que são as doenças respiratórias que se manifestam neste período. Como é amplamente conhecido, estas doenças podem ter efeitos mais significativos nos grupos de risco, que se assemelham aos da COVID-19. Com isso, pode haver um aumento de demanda por atendimento nos Estabelecimentos de Saúde, inclusive, em UTI. Cabe, no entanto, a estudos futuros essa análise.

Cabe ressaltar que, por se tratar de uma pesquisa em desenvolvimento pelo projeto SIGPampa, do Campus Itaqui da UNIPAMPA, os dados apresentados neste material são passíveis de adequações e atualizações, considerando que o próprio Plano de Contingência Hospitalar do RS (SES-RS, 2020) passa por atualizações em função do avanço dos casos de COVID-19.

A íntegra do estudo realizado, com os mapas e tabelas, está disponível em https://doi.org/10.31235/osf.io/6g8vr

APRENDA MAIS SOBRE O TEMA

A Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul, mantém um site específico com vários estudos e dados que auxiliam na compreensão da temática. Visite o endereço https://coronavirus.rs.gov.br/inicial e navegue pelas informações disponibilizadas. Veja que estão disponíveis o plano de contingência, cartas científicas, comitê de dados com projeções de cenários, entre outros.

No site do projeto SIGPampa, disponibilizamos um conjunto de pesquisas que vem sendo realizadas e que dão o suporte científico necessário à compreensão da temática https://sites.unipampa.edu.br/sigpampa/covid-19/outras-pesquisas/

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMIB. Comunicado da AMIB sobre o avanço do COVID-19 e a necessidade de leitos em UTIs no futuro. 2020. Disponível em http://www.somiti.org.br/arquivos/site/comunicacao/noticias/2020/covid-19/comunicado-da-amib-sobre-o-avanco-do-covid-19-e-a-necessidade-de-leitos-em-utis-no-futuro.pdf
DATASUS. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde – TABNET. 2020. Disponível em http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02
IBGE. Base cartográfica vetorial contínua do Brasil em escala 1:250.000, versão 2017. Disponível em http://geoftp.ibge.gov.br/cartas_e_mapas/bases_cartograficas_continuas/bc250/versao2017/
IBGE. Malha territorial municipal compatível com a escala 1:250.000, versão 2018. Disponível em http://geoftp.ibge.gov.br/organizacao_do_territorio/malhas_territoriais/malhas_municipais/municipio_2018/
SES-RS. Organização da saúde no território gaúcho – municípios, CRS, Regiões de Saúde,
Macrorregiões e Coredes. Porto Alegre: Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul, 2013. Disponível em https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20190107/29150758-municipio-regiao-crs-macro-corede.pdf
SES-RS. Plano de Contingência Hospitalar COVID-19 – Abril – versão 9.0, de 07/04/2020. Porto Alegre: Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul, 2020. Disponível em https://saude.rs.gov.br/upload/arquivos/202004/22175138-contingenciamento-dre-daha-4.pdf
UNIPAMPA. Estudo sobre coronavírus no RS tem primeiros resultados. 17 de abr. de 2020.
Disponível em https://sites.unipampa.edu.br/coronavirus/2020/04/17/estudo-sobre-coronavirus-no-rs-tem-primeiros-resultados/#more-605

Revisado por Cristina dos Santos Lovat.

SaveMat – Soluções em áudio e vídeo para o estudo da Matemática

O projeto SaveMat, iniciado em agosto de 2019, é uma colaboração entre docentes e discentes do curso de Matemática Licenciatura, do Campus Itaqui. A ideia surgiu ao se evidenciar a necessidade de auxiliar e de intervir de modo concreto junto aos acadêmicos do curso, em componentes da matriz curricular específicas da Matemática, como por exemplo, Teoria Elementar da Funções, Cálculos I, II, III e IV.

Com o passar dos anos e o aperfeiçoamento dos meios digitais, as mídias eletrônicas se tornaram muito mais atraentes aos olhos humanos. Segundo estudos realizados pelas empresas Hootsuite e We Are Social, o Brasil é o terceiro país no mundo onde as pessoas permanecem mais tempo conectadas, cerca de nove horas por dia. Mediante a isso, o uso de recursos audiovisuais no estudo e aprendizado de conceitos científicos se torna interessante, visto que, o uso de metodologias formais de estudo não é algo dinâmico e pode ser menos motivante aos acadêmicos.

Somado a isso, a falta de tempo e disponibilidade para o estudo extraclasse em cursos noturnos, quando muitos dos alunos trabalham durante o dia, traz maiores dificuldades no acompanhamento do curso, acarretando consequentemente em um menor rendimento acadêmico. Dessa forma, enquanto educadores, podemos intervir através de ações que facilitem o acesso e tragam de modo objetivo e fracionado conteúdos de cunho científico trabalhados em sala de aula.

Essa possibilidade e necessidade de ação via projetos que possibilitem a utilização, por parte dos alunos, de curtos períodos de tempo fora da sala de aula de uma forma mais adequada e eficiente é verificada em uma pesquisa realizada com alunos da FAEEBA – Faculdade do Estado da Bahia, por Sonneville (1992). Em tal pesquisa foi constatado que os próprios alunos reconhecem a necessidade e importância do tempo de estudo extraclasse e de se melhorar essa situação.

Nesse sentido, através do projeto buscamos incentivar o estudo de conceitos matemáticos fundamentais no desenvolvimento intelectual, produzindo materiais didáticos complementares na forma de áudios e vídeos de curta duração. Nosso objetivo é auxiliar no processo de ensino-aprendizagem, estimulando uma cultura de estudo nos acadêmicos, além de promover a redução dos índices de reprovação e evasão no Curso de Matemática do campus de Itaqui.

O material didático é definido pelos docentes Alisson Darós Santos e Elisa Regina Cara, os quais elaboram e editam o conteúdo a ser gravado e pelos discentes Anny Elise antos Nunes e Gabriel Carpes Irala, diretamente envolvidos no projeto e pela discente Ketolyn Raylla Medeiros Silva Dias, responsável pela edição dos vídeos. A participação dos acadêmicos colaboradores trouxe uma linguagem mais acessível e diferenciada aos demais discentes do curso bem como despertou a vontade de se envolverem mais com o projeto.

Inicialmente, os vídeos foram gravados com os professores coordenadores e com os discentes Anny e Gabriel. Em seguida, os demais docentes e discentes do curso de Matemática foram convidados a participar dos vídeos. A adesão foi bastante significativa, como pode ser observado acessando os vídeos disponibilizados.

O tema é definido pelos docentes, que passam o referencial para o discente ou docente participante daquele vídeo, com diferentes exemplos, dando ênfase aos conceitos fundamentais do tema abordado. Nas referidas gravações, os participantes do projeto, bem como, os coordenadores do projeto, buscam sanar as eventuais dificuldades dos discentes, ressaltando os conceitos matemáticos envolvidos nos tópicos abordados em cada componente trabalhada. No primeiro semestre de execução do projeto foram gravados vídeos contendo a resolução de exercícios de Cálculo I. No decorrer do projeto, serão abordados outros temas, relacionados às componentes curriculares mencionadas anteriormente.

Para que os discentes pudessem acessar e/ou baixar esse material em seus celulares, computadores ou tablets, foi criado um canal no YouTube (Figuras 1 e 2) para a hospedagem de todos os vídeos elaborados. Procuramos com isso evidenciar a forma como as tecnologias estão presentes no cotidiano, representando uma ferramenta para estudo e absorção de conhecimento. Dessa forma, auxiliar no aprendizado não somente dos alunos do curso da Matemática como também de todos que buscam novas metodologias com relação aos temas em questão.

O canal é livre e aberto para o público, todos os vídeos são didáticos e relacionados ao ensino da matemática. Além disso, são aceitos comentários para que o público possa tirar dúvidas e também indicar novos temas. Devido a Pandemia Covid19, o projeto está temporariamente suspenso, entretanto, o canal no YouTube já conta com muito material, podendo ser acessado pelo link: https://www.youtube.com/channel/UC7SI4A6IfabAPEcTlHgxzTw.

 

Ketolyn Raylla Medeiros Silva Dias é acadêmica do curso de Engenharia Cartográfica e de Agrimensura, UNIPAMPA – Campus Itaqui–. E-mail: ketolyndias.aluno@unipampa.edu.br
Gabriel Carpes Irala é acadêmico do curso de Matemática – Licenciatura, UNIPAMPA – Campus Itaqui –. E-mail: gabrielirala.aluno@unipampa.edu.br
Anny Elise Santos Nunes é acadêmica do curso de Matemática – Licenciatura, UNIPAMPA – Campus Itaqui–. E-mail: annynunes.aluno@unipampa.edu.br
Alisson Darós Santos é professor do Magistério Superior na UNIPAMPA – Universidade Federal do Pampa, Campus de Itaqui/RS. Doutor e Mestre em Matemática pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Graduado em Matemática, Licenciatura Plena, pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. E-mail: alissonsantos@unipampa.edu.br

Referências e sugestões de leitura
MORAN, J. M.; MASETTO, M. T.; BEHRENS, M. A. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2003.
MORGAN, C. T.; DEESE, J.
Como Estudar. Livraria Freitas Bastos S.A, 1980.
SONNEVILLE, J. O Tempo de Estudo e de Trabalho do Aluno Universitário – Um Estudo de Caso da FAEEBA. Revista FAEEBA, 1992.
SOUZA, l. T. P. Estudo do Aluno Universitário para a Construção de um Projeto Pedagógico. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, 1993.

Projeto “+BICT – Curso de Nivelamento Interdisciplinar”

Pedro Emanoel Peres DIANI; Caroline Jaskulski RUPP; Caroline Raquel BENDER;
Cristina dos Santos LOVATO; Leugim Corteze ROMIO; Eloir MISSIO.

O projeto +BICT – Curso de Nivelamento Interdisciplinar é um curso de nivelamento vinculado ao curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, o BIC&T, da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), campus Itaqui. Tem o objetivo de proporcionar a discentes do BIC&T, e demais interessados, a aquisição de conhecimentos básicos e necessários ao processo de ensino-aprendizagem. Com isso, busca um melhor desempenho de acadêmicos e, consequentemente, quer combater a evasão.

O curso de nivelamento está programado para acontece de forma inteiramente on-line, nos meses de junho e julho deste ano. O período de inscrição teve início no dia 20 de maio e termina no próximo dia 31 de maio. A inscrição é realizada mediante preenchimento de um formulário online (clique aqui). O programa do curso está dividido em quatro módulos, sendo dois módulos por mês. Os conteúdos a serem abordados são os das disciplinas de Português Instrumental, Bases Matemáticas, Química Geral e Física Geral.

É de conhecimento comum dos cidadãos brasileiros que o ensino básico e médio público no Brasil é, em geral, defasado, tendo em vista o quão despreparados os alunos saem das escolas. Quando entram nas universidades, eles demonstram falta de conhecimento básico, necessários para que eles possam acompanhar as disciplinas chaves à sua formação superior. Essa defasagem gera dificuldades para se adaptar à nova e intensa rotina de estudos na universidade, provocando, muitas vezes, a desistência de seguir no ensino superior. Isso certamente acarreta a falta de mão de obra qualificada, já observada no mercado de trabalho.

Afinal, qual é o motivo disso tudo acontecer? José da Silva Santos Junior e Giselle Cristina Martins Real (2017), ambos da Universidade Federal da Grande Dourados (MS), realizaram um levantamento das pesquisas existentes sobre a evasão no ensino superior brasileiro a partir da década de 1990. Concluíram que a defasagem seguida de evasão que detectamos, acontece porque o ingresso à educação superior no Brasil sempre esteve, no período estudado, restrito a uma pequena parcela da população. A restrição acabou por caracterizar a universidade pública como um “sistema de elite”, o qual ficou vigente até meados dos anos 2000. Nesse sistema, “os filhos das elites” estudavam muito mais no ensino superior porque estavam em melhor condições de entrar nele, ao passo que o povo empobrecido precisava “se virar” com o que se tem a seu dispor para ingressar e permanecer no ensino público do país. Hoje em dia o acesso foi ampliado, mas o ensino básico e médio público continua a registrar altas taxas de insuficiência na aprendizagem.

É de se esperar, então, que a dificuldade em interpretar e solucionar problemas abordados nas diferentes áreas de conhecimento na universidade gera desconforto. Pode gerar o sentimento de inaptidão para cursar o ensino superior, resultando na desistência em cursar disciplinas iniciais ou não da graduação, e até mesmo a desistência do curso.

Nesse contexto, a presença do Português, da Matemática, da Química e da Física nesta proposta se justifica pela necessidade primordial do entendimento da linguagem, do cálculo numérico, da composição química dos elementos e das forças invisíveis que movem o mundo. Consideramos que a compreensão desses conteúdos é fundamental a todas as demais áreas do conhecimento e, consequente, ao avanço satisfatório na graduação.

O curso ocorrerá da seguinte forma: ocorrerão aulas online todas as semanas via videoconferência, as quais contarão com a monitoria de um bolsista e a supervisão de um(a) professor(a). Os materiais didáticos e as atividades avaliativas serão disponibilizadas e realizadas no Moodle, que será o Ambiente Virtual de Aprendizagem. Como todo e qualquer problema precisa ser enunciado e precisamente interpretado, o primeiro módulo será o de Português Instrumental.

Acesse o formulário on-line de inscrições aqui: https://forms.gle/cMJSq6iMATDesCMx6

Membros do Projeto: Caroline Jaskulski Rupp, Caroline Raquel Bender, Cristina dos Santos Lovato, Leugim Corteze Romio e Eloir Missio. 

Bolsista: Pedro Emanoel Peres Diani

Referência bibliográfica
JUNIOR, José da Silva Santos; REAL, Gisele Cristina Martins. A evasão na educação superior: o estado da arte das pesquisas no Brasil a partir de 1990. Avaliação – Revista de Avaliação da Educação Superior, v.22, n.2, p.385-402, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/aval/v22n2/1982-5765-aval-22-02-00385.pdf. Acesso em: 20 de maio de 2020.

Revisão e edição de Walker Douglas Pincerati.

O uso da mediação como forma eficaz no tratamento dos conflitos familiares

A jurisdição é função típica do Poder Judiciário. Pode ser conceituada “como a atuação estatal que visa à aplicação do direito objetivo no caso concreto, resolvendo com definitividade uma solução de crise política e gerando com tal a solução a pacificação social”, como se lê em Neves (2018, p.59).

Entretanto, o Estado não detém, por meio da jurisdição, o monopólio da resolução dos conflitos; por isso são admitidas pelo Direito outras maneiras pelas quais as partes podem buscar a solução de um conflito em que estão envolvidas. Essas alternativas são chamadas de “métodos adequados de tratamento do conflito”. Quatro espécies desses métodos foram reconhecidas pelo ordenamento jurídico brasileiro: a autotutela, a autocomposição (tradicionalmente chamada de conciliação), a arbitragem e a mediação. Entretanto, o legislador deixou margens para “outros métodos de solução consensual” dos conflitos, conforme se comprova através da análise do parágrafo 3º do Código de Processo Civil.

A aplicação da mediação em procedimentos que envolvem demandas familiares pelo Poder Judiciário foi ganhando espaço através da publicação da Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça. A constatação que a jurisdição estatal não é a única forma de solução dos conflitos foi devidamente consagrada no Novo Código de Processo Civil (NCPC), Lei nº 13.105/2015. A nova legislação reconheceu a adoção do sistema multiportas de tratamento de conflitos, devendo-se prestigiar sempre o meio mais adequado para cada conflito a ser resolvido.

Já no início do Novo Código, no capítulo reservado ao estudo das normas fundamentais do processo civil, o legislador deixa expresso no artigo 3º, o acolhimento das formas alternativas de tratamento de conflitos. Inclusive, em seu parágrafo 2º, o legislador deixa expressa sua preferência por tal modelo.

Além de trazer disposições no começo da lei, a palavra ‘mediação’ é encontrada 39 vezes ao longo do Novo Código, sendo que há artigo específico definindo o instituto.

O parágrafo 3º do artigo 165 do NCPC ensina que o mediador atua preferencialmente nos casos em que tiver havido liame (ligação, vínculo) anterior entre as partes. Trata-se de hipóteses em que as partes já tinham um vínculo continuado antes do surgimento da lide (peleja), o que caracteriza uma relação continuada entre elas. Questões envolvendo o direito das famílias são exemplos do campo onde a mediação pode e deve ser empregada.

A mediação é um método adequado de tratamento de conflito, através da qual um terceiro devidamente capacitado e imparcial conduz e proporciona o restabelecimento da comunicação entre as partes para que elas mesmas possam chegar à resolução do conflito instaurado. Portanto, o mediador conduz as partes a descobrirem a causa da crise de forma a possibilitar que ela cesse e, assim, que o conflito seja resolvido. As partes chegam por si sós à solução consensual.

O legislador acreditou tanto na mediação como forma de tratamento eficaz no tratamento de conflitos que autorizou seu uso não apenas no começo do processo, mas também em processos em andamento. Percebe-se que a intenção do legislador é merecedora de aplausos e que os artigos que tratam da mediação são brilhantes. Porém, como é de costume no Brasil, ainda faltam políticas públicas pré-processuais que possibilitariam com que concretamente os conflitos fossem resolvidos sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário; deixando que só chegassem neste os casos em que sua atuação é realmente necessária. Acredita-se que com o estabelecimento de tais políticas menos processos bateriam à porta do Judiciário, o qual teria tempo para se debruçar nas demandas em que sua atuação é imprescindível.

Importante salientar que a aplicação da mediação no procedimento de demandas familiares pelo Poder Judiciário não afasta o trabalho exercido, de modo extrajudicial, por mediadores particulares. A pulverização de centros de mediação de conflitos nos Municípios seria

estratégia válida para ampliar o diálogo entre os envolvidos nas crises familiares. Muitas vezes, a presença de alguém especializado para guiar a conversa e influenciar as partes para que elas vejam o problema por outro ângulo pode fazer com que as desavenças sejam resolvidas com o diálogo, com orientação qualificada, dispensando a necessidade da demanda ser levada à apreciação do Estado.

O sentimento de capacidade que certamente será experimentado pelas partes é um aspecto que torna a mediação bastante atraente, como forma alternativa de tratamento de conflitos. A perspectiva de uma solução de conflito, sem o cunho de uma decisão impositiva e que respeita o interesse dos envolvidos, é uma característica que pode fazer da mediação um grande e efetivo instrumento de pacificação social e desafogamento do Poder Judiciário.

Os números de ações judiciais que chegam diariamente ao Poder Judiciário são alarmantes. O Estado, através da sua função jurisdicional, não está mais conseguindo suprir os anseios sociais na resolução dos conflitos sociais. O ordenamento jurídico já possui instrumentos alternativos de tratamento de conflitos, inclusive, o legislador do Novo Código de Processo Civil, sensível a essa realidade, trouxe a previsão da possibilidade da adoção de equivalentes jurisdicionais.

Conrado Paulino da Rosa e Fernanda Tartuce, estudiosos do assunto, avaliam que o uso da mediação para solução dos conflitos familiares trará maior efetividade no tratamento do conflito, em razão da vontade das partes ter sido a protagonista na decisão final.

O ordenamento jurídico está estruturado para que o uso da mediação como forma de composição de litígio seja ampliada tanto no âmbito judicial, quanto na esfera extrajudicial, ou seja, antes da necessidade de provocar o Judiciário. O que resta agora é a conscientização dos profissionais que atuam nos conflitos, que devem, quando possível, deixar de lado a sua face litigante e mostrar ao seu cliente que o tratamento do conflito através da mediação é a forma mais eficaz para que o problema não se repita.

Mariane Contursi Piffero
OAB/RS 80.297B

A prática da Justiça Restaurativa: resultados de sua implantação em São Borja

A cultura sob a lógica da competitividade, por meio da disputa, tem demonstrado a necessidade de novas formas de convivência. Para tanto, surge uma outra perspectiva denominada de Cultura de Paz, cuja busca e persistência em sua implementação está amparada em organismos e legislações internacionais. E é pelos caminhos da educação, seja ela formal ou não, que se tem a grande esperança de dias melhores, com o exercício diário de convivência sem violência. Para tanto, é necessário garantir educação de qualidade como direito universal dos cidadãos do mundo. É nos espaços formativos, educativos, que encontramos o modo concreto de construção de uma nova cultura pela educação para a paz, que, com princípios e objetivos, manifesta-se em diversas tradições e conceitos.

As origens da Justiça Restaurativa são antigas. Cultural e antropológica, é inspirada nas antigas tradições dos povos nativos do Canadá, da Nova Zelândia, da África do Sul e até mesmo do Brasil. Nelas, o dano gerado à comunidade por alguém era compreendido como um problema de todos. E todos resolviam juntos, objetivando que o equilíbrio dentro da comunidade fosse restaurado e a coesão social fosse mantida, oportunizando à vítima que sua pessoa e sua história de vida não fossem esquecidas. É nessa perspectiva a Justiça Restaurativa surge como alternativa à Justiça Retributiva para novas formas de resolução de conflitos. Quer solucionar conflitos de menor ou maior potencial ofensivo via diálogo e mediação entre as partes para restaurar danos, e, principalmente, quer restabelecer as relações continuadas entre os sujeitos envolvidos. Para isso, conta com a colaboração e o envolvimento de toda a comunidade.

Os primeiros estudos sobre Justiça Restaurativa no Brasil foram realizados por iniciativa do jurista brasileiro Pedro Scuro Neto, em 1999, no Rio Grande do Sul. Com a criação da Resolução 2002/12, de 24 de julho de 2012, do Conselho Econômico e Social da ONU, a Organização das Nações Unidas, os estudos de Scuro Neto são levados ao Conselho Nacional de Justifica que, com o apoio financeiro do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o PNUD, órgão da ONU, dará início a três projetos pilotos. Os três projetos pilotos são desenvolvidos em três cidades: (a) Porto Alegre/RS, direcionado à infância e juventude; (b) São Caetano do Sul/SP, também direcionado à infância e juventude; e (c) Brasília/DF, no Juizado Especial Criminal (ver LARA, 2013). As primeiras práticas restaurativas aconteceram em Porto Alegre, no ano de 2002, na 3ª Vara do Juizado Regional da Infância e da Juventude. Foi a experiência que mais se desenvolveu e, como consequência, criou o protocolo de cooperação através do projeto “Justiça para o Século 21: Instituindo Práticas Restaurativas”, tendo como grande protagonista Leoberto Brancher, Juiz de Direito.

Uma abordagem é restaurativa quando os meios usados na resolução de um conflito ou infração são pautados na responsabilidade, no encontro, no diálogo, na reparação do dano, na horizontalidade e na coesão. A união do paradigma teórico e a prática se dá concretamente nas práticas restaurativas, porque oportuniza a mudança de pontos de vista dos envolvidos e transforma as pessoas e os relacionamentos. Os encontros são organizados por pessoas treinadas, para que os participantes tenham voz. Nesses encontros, as vítimas, inclusive indiretas, e o ofensor concordam em se encontrar frente a frente e falar de seus sentimentos, afim de resgatar as relações perdidas e evitar a reincidência. O objetivo do enfoque restaurativo é o de desenvolver a capacidade das pessoas de se transformarem mediante suas reais condições, seja de vítima, de ofensor, de cidadão ou de membro de uma instituição. 

Os encontros são denominados de “círculos de construção de paz”, dado que os processos circulares se apresentam nos dias atuais como alternativas concretas na mediação de conflitos, sob o prisma teórico e prático da comunicação não violenta. Nessa perspectiva, de caráter ancestral, as pessoas se reúnem em círculo e usam um objeto chamado “bastão de fala”. Esse bastão é passado de pessoa a pessoa. E quem estiver com ele é o detentor da palavra, enquanto as outras pessoas fazem uma escuta ativa. Esse processo ancestral constitui um espaço democrático e inclusivo, ao mesmo tempo em que institui a resolução de conflitos por meio do fortalecimento de vínculos e reparação dos danos. Portanto, o círculo de construção de paz é um processo para se construir e reconstruir relacionamentos com base na confiança e no cuidado das relações de afeto.

O Município de São Borja/RS foi contemplado com a institucionalização do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania/CEJUSC, em 2016, mediante à implantação dos métodos autocompositivos de Mediação Judicial, Conciliação Judicial e Justiça Restaurativa, a partir do protocolo de Cooperação entre instituições públicas e privadas de São Borja. Isso oportunizou a formação de facilitadores judiciais em justiça restaurativa. Após a formação, os facilitadores judiciais se inseriram em áreas estratégicas de atuação. Nosso foco de análise se restringiu à área da educação com a participação ativa e efetiva de 4 escolas e gestores municipais e estaduais da área da educação pública. A escola é um espaço onde crianças e adolescentes apreendem e exercitam suas experiências de vida. Nesse sentido, é em sala de aula que ocorre a descarga de suas frustrações, suas expectativas, atitudes tanto positivas quanto negativas, pois nesse ambiente estão outros sujeitos, com experiências parecidas ou totalmente diferentes das suas.

É nesse contexto tão importante que apresentamos como resultado a formação de 240 profissionais das quatro escolas que compuseram a experiência piloto, que se materializou através de 8 oficinas de formação, duas em cada escola. Posteriormente, ocorreu a realização de 38 círculos de construção de paz, atendendo profissionais de todas as áreas que compõem os recursos humanos das escolas e gestores das secretarias Municipal e Estadual de Educação (35ª Coordenadoria).

Um dado muito importante refere-se à interdisciplinaridade, pois todo o processo de planejamento e execução dos círculos foi feito em equipe interdisciplinar. A interdisciplinaridade foi e é um elemento fundamental na qualidade das ações. O projeto proporcionou aproximações de diversas áreas do saber, possibilitando de forma concreta ações pedagógicas efetivas nos processos circulares. Os dados apontam que a visão de educação dos professores e demais profissionais vai ao encontro da concepção da educação para a paz, ou seja: o formar para além de profissionais, cidadãos críticos e defensores dos ideais de paz, é realizado através dos esforços para que essa educação seja inovada, transformada e democratizada. É inegável a contribuição do processo circular para promover sentimentos de pertencimento e desenvolver a participação democrática entre as pessoas, cultivando a consciência coletiva, em consideração com todos, a partir de suas dificuldades de potencialidades.

Indicações de Leitura:
BRANCHER, Leoberto. Programa Justiça Restaurativa para O Século 21 – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. AMB, 2015.
JACCOUD, Mylène.
Princípios, Tendências e Procedimentos que Cercam a Justiça Restaurativa. Justiça Restaurativa (Brasília – DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD). Brasília, 2005.
LARA, Caio Augusto Souza.
Dez anos de práticas Restaurativas no Brasil: a Afirmação da Justiça Restaurativa como Política Pública de Resolução de Conflitos e Acesso à Justiça. Dissertação de Mestrado. Belo Horizonte, 2013.
PRANIS, Kay.
Processos circulares. SP: Palas Athena, 2010.
PRANIS, kay, WATSON, Carolyn Boyes. Círculos em Movimento: Construindo uma Comunidade Escolar Restaurativa. Tradução: BASTIAN, Fátima de. AJURIS: Porto Alegre, 2015.
ZEHR, Howard.
Trocando as lentes – Um Novo Foco Sobre o Crime e a Justiça. São Paulo: Palas Athena, 2008.


Simone Barros de Oliveira é Doutora em Serviço Social e docente da Universidade Federal do Pampa, atuando no Curso de Serviço Social, campus São Borja. É vice-líder do grupo de pesquisa “Educação Direitos Humanos e Fronteira” e coordenadora do projeto de pesquisa “Cultura de Paz e Justiça Restaurativa em São Borja: Implantação e Monitoramento”.

Revisão e edição de Walker Douglas Pincerati