Arquivo da categoria: v. 1 n. 3 (2020)

Universidade e Comunidade: problematizando a extensão universitária

A universidade brasileira é sustentada pelo tripé do ensino, pesquisa e extensão. Neste sentido, suas funções são completas quando esses três pilares se desenvolvem de forma articulada. A pesquisa produz referências para a construção do ensino e instrumento para a promoção da extensão; a extensão colabora para a popularização da ciência e qualificação das demandas ao possibilitar a comunicação entre a universidade e a sociedade. O ensino discute a realidade desvendada pela extensão e pela pesquisa e proporciona novas aprendizagens. A universidade na sua completude é assim. Nunca para ou se isola num único campo do saber ou de origem do saber. 

É neste sentido que as iniciativas de extensão universitária têm um papel fundamental, tanto para a qualificação da Universidade, quanto para a promoção de intercâmbios sociais com a comunidade onde esta inserida. Os projetos de extensão que a Universidade desenvolve buscam valorizar as atividades extensionistas na formação acadêmica, com a preocupação de integrá-la ao ensino e à pesquisa, buscando por vezes superar o ensino disciplinar.

Infelizmente, a extensão (e por vezes também a pesquisa) é um espaço periférico na formação dos estudantes. Os métodos de ensino-aprendizagem são essencialmente bancários (sala de aula) e de transferência de informação. Na maioria das Universidades brasileira, a atividade de extensão atinge poucos estudantes, são atividades isoladas, raramente integradas às atividades de ensino e, muitas vezes, não integram o “círculo” da formação professor – estudante – universidade – sociedade – professor.

O ensino disciplinar fragmenta a formação acadêmica, impossibilitando ao estudante a visão do todo e da complexidade que é o processo de aprendizado. De acordo com Saviani (2010, p. 209), as interlocuções pedagógicas entre os saberes teóricos e práticos permite a aproximação do saber popular com o saber científico possibilitando “… uma aguda consciência da realidade em que vão atuar associada a um consistente preparo teórico-científico que os capacite à realização de uma prática pedagógica coerente e eficaz”.

Ou ainda, conforme destaca Chauí (2006, p. 140), a educação democrática se viabiliza pela participação popular, pela participação do estudante enquanto sujeito, mas também de sua respectiva comunidade ou organização social, que é o meio de intervir nas tomadas de decisões políticas implicadas no coletivo, especialmente se considerar que “[…] a participação popular só será política e democrática se puder produzir as próprias leis, normas, regras e instituições que dirijam a vida sociopolítica” (CHAUÍ,2006, p.140).

Para esse desafio educativo é demandado, num primeiro momento, um “novo” educador. A transversalidade do conhecimento e a abordagem histórica crítica do referencial pedagógico proposto exige um professor que consiga atuar para além das disciplinas, de modo a conseguir se articular com outros campos do conhecimento, no caso específico, com aqueles que versam sobre as transformações da sociedade, da natureza, das comunidades, da realidade social. 

Um segundo desafio educativo, na formação profissional, é a exigência de um “novo” gestor. Alguns docentes exercem o papel de gestores na medida em que são diretores, coordenadores de curso, presidentes ou coordenadores de comissões. Para tal, o desafio é no sentido de incorporar a democracia enquanto participação popular, seja protagonizada pelas participações de membros externos da Universidade, seja protagonizada pela participação da comunidade interna de modo geral (estudantes e servidores Técnicos Administrativos). A participação dos estudantes, sujeitos aprendizes, perpassa outros espaços e momentos com potencial educativo como a reflexão sobre as vivências na sua comunidade de origem, a valorização de sua cultura, e a participação nas instâncias decisórias institucionais, especialmente por meio da organização do movimento estudantil e agremiações.

Nos últimos anos, ocorreram alguns avanços institucionais sobre a promoção e incorporação da extensão na formação universitária. Um marco importante foi a criação do Fórum de Pró-Reitores de Extensão e a constituição da RENEX (Rede Nacional de Extensão), que definiram o conceito expresso no I Encontro Nacional de Pró-Reitores de Extensão:

A Extensão Universitária é o processo educativo, cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre universidade e sociedade. A Extensão é uma via de mão dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento académico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento. Esse fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, terá como consequência: a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional; a democratização do conhecimento académico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade. Além de instrumentalizadora desse processo dialético de teoria/prática, a Extensão é um trabalho interdisciplinar que favorece a visão integrada do social. (FORPROEXT, 2001, p. 4).

No ano de 2012 o FORPROEX estabeleceu que: “Um dos passos fundamentais em direção à universalização da Extensão Universitária está em sua inclusão nos currículos, flexibilizando-os e imprimindo neles um novo significado com a adoção dos novos conceitos de ‘sala de aula’ e de ‘eixo pedagógico’”. É importante destacar que o FORPROEX alerta que a inclusão da extensão universitária nos currículos não se trata de uma incorporação de atividades extensionistas, mas da criação de novos espaços, como componentes específicos para esta finalidade.

É importante ter claro que não se trata apenas de aproveitamento de créditos oriundos de atividades extensionistas, para efeitos de integralização curricular ou de criação de novas disciplinas relacionadas com a Extensão Universitária, mas, sim, de sua inclusão criativa no projeto pedagógico dos cursos universitários, assimilando-a como elemento fundamental no processo de formação profissional e de produção do conhecimento (FORPROEX, 2012, p. 12).

A nova legislação que assegura no mínimo 10% do total de créditos curriculares exigidos para a graduação em ações de extensão universitária irá conferir créditos à atividade de extensão, atingindo assim, a totalidade dos estudantes. Entretanto, dependendo de como as Universidades implantarem a curricularização da extensão, a medida poderá se mostrar pouco eficaz e piorar ainda mais antigos problemas, como a carga horária total e tempo de permanência dos estudantes nas universidades. As discussões realizadas até o momento nas universidades brasileiras apontam para a tendência de transformar a participação dos estudantes nos projetos de extensão em créditos (o que certamente “turbinará” os projetos de extensão) e de reconhecer as atividades “extra classe” desenvolvidas pelos estudantes como atividades curriculares de extensão (Ações Complementares de Extensão – ACEx). Essas medidas podem facilitar o cumprimento da carga horária de extensão exigida; contudo, tende a não cumprir com o objetivo principal da proposta que é promover contribuições para a promoção do ensino e da pesquisa de acordo com as demandas sociais. Ou seja, o esforço de incluir a extensão nos currículos está relacionada diretamente à qualificação do ensino e da pesquisa, para além do cumprimento de uma carga horária isolada e individualizada.

A incorporação da atividade de extensão na formação universitária deveria afetar de forma sistemática o ato de apreender e ensinar na universidade – como uma integralidade articulada. A questão que deve ser colocada é de como incorporar a extensão (e a investigação) nas atividades cotidianas dos estudantes? Parece que a melhor estratégia seria sua incorporação nos componentes curriculares do núcleo rígido, com destinação de carga horária, definida previamente no currículo. Entretanto, essa é uma estratégia que exige da universidade uma centralidade e prioridade na extensão, pois implicará numa disputa por recursos (meios de transporte, estruturas de articulação com meio, etc) e por encargos didáticos.

Acredita-se que na formação universitária o desafio está muito além da distinção entre informação e conhecimento, como diria o Professor Paulo Freire (2010), de criar nos educandos as possibilidades para a própria produção e construção do conhecimento. E a criatividade dificilmente será estimulada no tradicional ensino disciplinar, com uso de métodos de ensino-aprendizagem essencialmente bancários e de transferência de informação. Nesta perspectiva, a incorporação da atividade de extensão e de pesquisa na formação universitária são um grande alento, desde que a incorporação afete de forma sistemática os métodos de aprendizagem e de ensino na Universidade.

Referências e sugestão de leitura

CHAUÍ, Marilena. Cidadania Cultural: o direito a cultura. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2006.
FÓRUM DE PRÓ-REITORES DE EXTENSÃO (FORPROEXT) DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS.
Plano Nacional de Extensão Universitária. Ilhéus: Editus, 2001.
FREIRE, Paulo.
Extensão ou comunicação? 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2010.
SAVIANI, Dermeval.
Interlocuções pedagógicas: conversa com Paulo Freire a Adriano Nogueira. Campinas: Autores Associados, 2010.

PROFESSOR NOTA 10: ANGELITA MACHADO LEITÃO

Olá sou a Angelita Machado Leitão, fui convidada pelo Jornal Interdisciplinar para contar um pouco de minha trajetória acadêmica, dos componentes que ministro e dos projetos que desenvolvo. Mas antes vou falar um pouco de minha vida pessoal, sou natural de Pelotas, mas em 2017 recebi o título de Cidadã Itaquiense por serviços prestados a comunidade, sou docente da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), membro do Rotary Club de Itaqui, Distrito 4780 desde 2016 e atualmente faço parte da diretoria da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). Bom vamos ao que interessa possuo graduação em Química de Alimentos (2002), mestrado em Ciência de Alimentos (2007) e doutorado em Ciência e Tecnologia de Alimentos (2012) todos pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Fui professora substituta no curso de Bacharelado em Química de Alimentos (UFPel) por duas vezes (2002 a 2005 e 2008 a 2009) desenvolvendo diversos componentes curriculares e projetos. Um dos projetos desenvolvidos rendeu uma premiação na II Mostra da Produção Universitária da FURG, 2003, com título “Utilização de farinha de resíduos de bananas (Musa spp.) para produção de biscoitos” apresentado pela bolsista Susana Vieira Lamas. Entre o mestrado e o final do doutorado também trabalhei como responsável técnica (2007 a 2011) na Cervejaria Original Bier, como cervejeira produzindo chopp tipo pilsen, entre outras variedades de chopps. Desde 2012 desenvolvendo à atividade de docência na Unipampa, nesse período já fui coordenadora do CTA (2013 a 2014), vice coordenadora (2018), e hoje sou vice coordenadora da Especialização em Tecnologia de Alimentos. Ministro os componentes curriculares de Seminários I, Conservação de Alimentos, Análise Sensorial de Alimentos, Tecnologia do Açúcar e Bebidas e Tecnologia de Balas e Chocolates, no curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos (CTA) e no Bacharelado Interdisciplinar em Ciência (BICT) o componente curricular de Conservação de Alimentos. Desde que cheguei na Unipampa desenvolvo projetos na área de ensino, extensão e pesquisa. Em pesquisa trabalho na área de ciência e tecnologia de alimentos, mais precisamente voltados a bebidas alcoólicas fermentadas a base de mel (cerveja, Hidromel e melomel), destiladas (cachaça) e por mistura (licores), bebidas não fermentadas, flores (Capuchinha e Amor perfeito) e insetos (Tenebrio) comestíveis e resíduos das indústrias de cerveja e vinícola. A partir dos meus projetos já foram defendidos sete Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) em bebidas, quatro com flores comestíveis e um com resíduos da vinícola e os demais TCCs em áreas a fins. Um dos meus trabalhos sobre bebidas por mistura foi premiado no X Simpósio de Alimentos – SIAL 2018 apresentado pela discente Rejane Morais. Possuo quatro capítulos de livros, sendo o primeiro em 2009 com título “Tecnologia de frutas e hortaliças – Modulo V – Frutas e hortaliças em conserva”, Tecnologia de frutas e hortaliças: conservas apertizadas em 2012 ambos pela Editora e Gráfica Universitária da UFPel, Princípios de Inovações em Ciência e Tecnologia de Alimentos em 2015, pela editora AMC Guedes e Divulgação do curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos em escolas através do projeto universidade itinerante: relato de atividades desenvolvidas em 2017.

Movimento Hip Hop, Cultura de Gangues e Rearticulação Simbólica – Transformando as formas de disputa territorial da juventude de Jaguarão (RS)

por Igor Polatschek,
revisão e edição de Walker Douglas Pincerati.

O ano é 2019, o lugar é Jaguarão (Rio Grande do Sul), centro da cidade, porta de uma conhecida casa noturna local. O clima é tenso! Dois grupos, oriundos de bairros diferentes, marcam posições opostas em meio à multidão: são jovens. Seguramente nenhum deles passa dos trinta (alguns sequer dos dezesseis). Olhares desconfiados e semblantes fechados se agravam entre uma risada e outra. A briga estoura: barulhos de garrafas quebrando, xingamentos, fúria. Meninos batem, meninos apanham. Meninas choram, outras riem. O grupo vencedor sai contando vantagem, rindo, justificando o motivo da briga como justa por conta de uma covardia anterior feita pelos rivais. Os rivais, estes poucos notaram saindo.

É raro encontrar uma noite de fim de semana que não se encaixe na descrição acima. Vez ou outra um disparo ou uma facada deixa o acontecimento menos corriqueiro. Poderíamos também, sem que o parágrafo perca em verdade, mudar o ano: 2017, 2018, 2021?

Outra cena: o ano também é 2019 e o lugar também é Jaguarão, pista de skate, centro da cidade. Uma música agressiva embala uma aglomeração de jovens. Estes se dividem em dois blocos: o primeiro grupo age como o dono do pedaço – chamam uns aos outros aos gritos, riem alto, exibem suas manobras de skate, disputam quem faz mais flexões de braço. O segundo grupo está mais recluso em um canto, se movem de maneira mais contida e parecem atentos ao movimento, são uruguaios, vieram do outro lado da fronteira. Uma roda é formada e um integrante de cada grupo é chamado ao centro. Parecem nervosos, se olham com agressividade. Logo começam a proferir insultos ritmados um contra o outro. A disputa se encerra, os dois oponentes apertam as mãos e voltam cada um para seu grupo.

Essa última cena também não perderia em verdade se trocássemos o ano, o lugar e os personagens por uma vasta gama de opções, pois se refere a uma prática cultural globalizada: as batalhas de rap. Mas o evento específico leva o nome de Faroeste do Sul, e a ocasião narrada corresponde ao dia em que MC Gordão, do Morro Cerro da Pólvora (Jaguarão) venceu a disputa contra o uruguaio MC Warrior (da cidade de Rio Branco), levando os moradores do Cerro, que desceram a ladeira para assistir ao duelo, a comemorarem fervorosamente por se sentirem representados pela vitória de Gordão.

É possível perceber nesse evento vários fatores que remetem a uma cultura de violência: a divisão dos jovens em dois grupos marcados por diferenças de localidade de moradia; a agressividade da música; a troca de insultos; a palavra “Faroeste” no nome do evento – que faz alusão às assustadoras estatísticas da violência no município; o apelido de um dos MC’s que é chamado de Warrior – palavra da língua inglesa que significa “guerreiro”; a vitória de um dos lados do confronto vista como representativa para os habitantes de um território. Entretanto, apesar das inúmeras semelhanças simbólicas com as guerras urbanas contemporâneas – das pancadarias bairristas aos tiroteios entre facções criminosas multimilionárias, passando pelas chamadas tretas de gangues – a expressão do conflito realizada pelas batalhas de rap, ao contrário dessas outras expressões, não resulta em mortos.

As batalhas de rap representam uma das manifestações da cultura Hip Hop. Defendi no meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), baseado no estudo de Martin Lamotte sobre o tema, que o movimento Hip Hop surgiu, dentro de um contexto dominado por violentas disputas territoriais entre gangues, como uma nova forma de disputar territórios. Afrika Bambaataa, líder da gangue Black Spades e considerado um dos pioneiros do Hip Hop, ficou localmente famoso após fazer um acordo de paz entre gangues negras e latinas do South Bronx, região periférica da cidade de Nova Iorque (EUA). As disputas via grafite – na concorrência pela assinatura mais elaborada e no local mais chamativo da cidade, via a dança break – nos desafios entre grupos de dançarinos para ver qual fazia as acrobacias mais difíceis e impressionantes, via batalhas entre DJ’s – na competição pela equipe que teria a maior capacidade de animar o público das festas, e, posteriormente entre MC’s – no duelo entre a capacidade lírica e presença de palco dos oponentes; foram crescentemente endossadas por Bambaataa.

A cultura Hip Hop se constitui a partir desse ponto de vista como um meio alternativo de conquistar espaço, respeito, poder e, posteriormente, dinheiro (objetivos comuns ao universo das gangues) através da arte. Essas formas de arte e, por sua vez, a organização desses grupos de artistas têm uma relação estética de muita semelhança com a cultura de gangues. Vejamos como exemplo a LMK, organização do rap jaguarense criada por CPII, MC local. A sigla significa La Máfia Kennedy: o “La” importado do espanhol nos dá uma pista sobre o contexto local, o sentimento de pertencimento latino, tão esquecido pelos brasileiros, mas que fica mais evidente por causa do intercambio cultural de uma região de fronteira; a palavra “Kennedy” faz referência à Vila Kennedy, bairro do MC criador, trazendo à tona novamente a noção de território, pelo qual o grupo deve lutar e defender; a palavra “Máfia”, por sua vez remete ao modelo mais avançado de organização de grupos criminosos, que diferem de outras organizações da sociedade (além, obviamente, pela ilegalidade de seus negócios), pela alta capacidade adaptativa frente imprevistos e situações de desvantagem.

A lei que a LMK, a Faroeste do Sul e milhares de outras organizações do Hip Hop se esforçam para tentar quebrar é uma lei que não está escrita, mas que é religiosamente praticada. É a lei que impõe às periferias de Jaguarão, do Brasil, da América Latina e de muitos outros lugares do mundo a miséria o encarceramento em massa de suas juventudes (principalmente a negra), e o silêncio perante essa realidade. Os meios que as organizações da cultura Hip Hop se utilizam para tentar burlar essa “lei” são a denúncia dessa realidade pelas letras dos raps e um conjunto de formas de arte que são em si mesmas ao mesmo tempo expressões dos conflitos que impactam as juventudes periféricas e uma alternativa, ainda que simbólica, à esses mesmos conflitos.

Mas saber mais, veja vídeo do MC, escritor e palestrante KRS-ONE (clique aqui), considerado um dos mais proeminentes MC’s da cultura Hip Hop, nascido no Bronx, onde as primeiras festas da cultura tiveram início.

Igor Polatschek é Bacharel em Produção e Política Cultura pela Fundação Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA campus Jaguarão. Defendeu em 2019 o TCC Hip Hop versus Necropolítica, orientado por Walker Douglas Pincerati.

A violência contra crianças e adolescentes: Uma realidade invisível

Créditos: OMS, Organização Mundial da Saúde. Inspire: Sete Estratégias para pôr fim à violência contra crianças, 2016.

A violência contra crianças e adolescentes é um fenômeno social e global e o lapso entre a violência em suas manifestações cotidianas e a notificação (registro de denúncias e atendimentos) é enorme, sinalizando um imenso desafio para a construção de ações públicas para a proteção dessa população.

Em pesquisa documental realizada no ano de 2018, nos relatórios de registros de denúncia do Disque Direitos Humanos (Disque 100) entre os anos de 2016 a 2017, verificou-se uma diminuição de 45,71% nos registros em nível nacional. A realidade sul rio-grandense expressa um índice de expressiva queda nas denúncias, em torno de 54,98%, ficando atrás apenas dos Estados do Acre (56, 63%) e do Amazonas (56,21%).

Esses dados se não examinados de forma cuidadosa, podem nos levar ao erro de identificar que a violência contra crianças e adolescentes vem diminuindo significativamente no cenário brasileiro, ou seja, que o decréscimo nos registros sinalizaria uma importante redução de situações violadoras dos direitos infantojuvenis. Contudo, em um movimento de análise mais atenta é possível perceber que por detrás dessa ilusão existe um grave problema, que é a subnotificação da violência.

Afinal, o que é a subnotificação? A subnotificação consiste na ausência de dados sobre a violência, o não registro ou o registro incompleto dos atendimentos contribui para o ocultamento das situações de violência contra a criança e adolescente.

Diante a esse contexto, em 2018 realizou-se uma pesquisa que objetivou mapear as expressões de violência contra o segmento infantojuvenil e as estratégias para o seu enfrentamento em um município da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. A análise nos documentos de atendimento, possibilitou identificar que as vítimas de violência tem idade e gênero. Entre os anos de 2016 e 2018/1 foram atendidas 23 meninas e 16 meninos, representando uma diferença de 18%, assim podemos identificar que meninas sofrem mais com situações de violência no município.

Os dados referentes a faixa etária possuem significativa variação, entre os anos de e 2017 e 2018/1 o grupo etário dos 03 aos 08 anos de idade foi predominante nos registros de atendimento, no entanto, entre os anos de 2016 e 2017 a faixa etária prevalecente fora de adolescentes entre 12 e 14 anos, demonstrando uma variação entre crianças e adolescentes.

Outro dado interessante descoberto pela pesquisa, refere-se ao hiato entre o número de denúncias em comparação ao número de atendimentos às crianças e adolescentes no ano de 2017. Conforme os quadros abaixo:

Quadro 1 e 2: Denúncias e Atendimentos de 2017

Denúncias Registradas pelo Conselho Tutelar – 2017
Negligências 149
Abuso Sexual 28
Exploração Sexual
18
Violência Psicológica
0
Violência Física
75
Total 270

Quadro 1

Atendimentos Registrados – 2017
Negligência 4
Violência Sexual 14
Violência Física 4
Violência Psicológica 0
Total 21

Quadro 2

Essa discrepância entre o quantitativo de denúncia em relação ao de atendimento levou a equipe da pesquisa estabelecer duas hipóteses explicativas, que são elas:

1º O processo de confirmação da violação de direitos: Cabe ao Conselho Tutelar verificar a existência da violência e encaminhar as crianças, adolescentes e suas famílias para as entidades de atendimento da rede de proteção. O Conselho Tutelar ao averiguar a inexistência de situações e fatores violadores aos direitos desta população procede ao arquivamento do caso e/ou encaminhamento para algum serviço de atenção preventiva ou para as demais políticas sociais.

2: Rota Crítica 2 : Diz respeito ao caminho que as crianças, adolescentes e suas famílias percorrem na busca pelo rompimento com a violência, acrescentando-se nesse trajeto os obstáculos institucionais, políticos e estruturais que não raras vezes incidem para que a violência permaneça no silêncio.

As contribuições da pesquisa foram tecidas na perspectiva de elaborar pela primeira vez no município, dados estatísticos e informacionais sobre a situação da violência contra o segmento infantojuvenil. É notório que para a construção de políticas públicas atentas às particularidades da realidade local é fundamental a identificação da violência por meio de dados mensuráveis que possibilitem conhecer as peculiaridades da violência, perfil sociodemográfico das crianças, adolescentes, famílias e dos/as autores/as da violência, assim como das modalidades de atendimento e encaminhamento realizados.

A ausência de registros ou o preenchimento incorreto dos formulários de atendimento evidencia uma barreira significativa para a construção de dados confiáveis sobre a violência contra crianças e adolescentes, uma vez que as informações disponíveis são superficiais e desconexas. A partir dessa constatação empírica, a pesquisa segue compromissada em contribuir com subsídios teórico-práticos, para a organização dos documentos institucionais, a fim de promover um olhar ampliado dos/as profissionais sobre a importância do registro completo das particularidades da violência contra crianças e adolescentes.

Indicações de Leitura:

ANDI. Comunicação e Direitos. Disponível em: <https://www.andi.org.br/>.

BRASIL. Direitos da Criança e Adolescente. Violência contra Crianças e Adolescentes: Análise de Cenários e Propostas de Políticas Públicas. Ministério dos Direitos Humanos. Secretaria Nacional de Proteção dos / elaboração de Marcia Teresinha Moreschi –Documento eletrônico – Brasília: Ministério dos Direitos Humanos, 2018. Disponível em:< http://www.mdh.gov.br/biblioteca/consultorias/conada/violencia-contra-criancas-e-adolescentes-analise-de-cenarios-e-propostas-de-politicas-publicas.pdf>. CHILDHOOD Brasil. Pela Proteção da Infância. Disponível em: <https://www.childhood.org.br/>.

Dra. Monique Soares Vieira
Docente da Universidade Federal do Pampa
Curso de Serviço Social – Campus São Borja
Coordenadora da Pesquisa “A cartografia da violência contra crianças e adolescentes”

 

Vídeo: Produção de Álcool Gel 70% na UNIPAMPA-Itaqui

Pro Profª. Drª. Caroline R. Bender
carolinebender@unipampa.edu.br

Este vídeo demonstra de forma rápida os principais passos da metodologia experimental utilizada para a produção de álcool gel 70% (ou 70° INPM), que vem sendo realizada na UNIPAMPA-Itaqui. O intuito desta produção é distribuir o álcool gel para o serviço público de Itaqui, como uma ação no combate a pandemia da Covid-19.

Embora o vídeo demonstre os principais passos para esta produção, o tipo de polímero utilizado, as quantidades e concentrações de cada reagente, bem como o tempo de espera entre as etapas foram omitidos propositalmente. Isso foi feito para evitar que a população leiga assista ao vídeo e tente reproduzir a metodologia em casa. Pode parecer óbvio que esse tipo de procedimento não possa ser realizado em casa. Entretanto, com o aumento no número de casos de pessoas infectadas pelo vírus Sars-CoV-2, não foram poucas as “receitas” e vídeos que surgiram na internet ensinando a população a fazer álcool gel “caseiro.” Alguns procedimentos utilizam gelatina sem sabor ou gel de cabelos com espessante. Contudo, dependendo do que se utiliza como espessante em vez de o álcool eliminar o vírus pode gerar um efeito de potencialização e/ou irritação da pele. Além disso, muitas receitas utilizam aquecimento, o que, por sua vez, aumenta o risco de o produto inflamável entrar em combustão e provocar incêndios.

Como previamente mencionado na reportagem “Álcool em gel 70% contra o novo Coronavírus,” publicada neste jornal, o álcool 70° INPM possui a concentração ótima para o efeito antisséptico. O álcool comercializado em mercados e farmácias possui a concentração de 46º INPM, i.e., mais diluído que o álcool 70° INPM. Portanto, as receitas caseiras de álcool gel produzido a partir do álcool 46° INPM não serão eficientes para assepsia e higiene das mãos contra o Sars-CoV-2, uma vez que não atingem concentração adequada (o mesmo serve para a Vodka e bebidas alcoólicas similares). O álcool combustível também não pode ser utilizado, já que pode conter contaminações (resquícios de gasolina, diesel, hidrocarbonetos, metais pesados, etc.) provenientes da produção, transporte e/ou armazenamento. Os contaminantes podem alterar o pH do produto final.

Por último, é relevante enfatizar que o álcool gel vendido em farmácias e/ou produzidos por profissionais capacitados – utilizando substâncias que garantem a estabilidade e concentração adequada para matar o vírus – são os únicos que devem ser utilizados no combate a Covid-19 neste momento.

GFIMAH – Grupo de Pesquisa em Fisiologia e Manejo de Plantas Hortícolas

A região da fronteira oeste do Rio Grande do Sul, região onde está inserido o Campus Itaqui da UNIPAMPA, é quase que inteiramente caracterizada pelo cultivo do arroz e atividade da pecuária de corte. O GFIMAH tem como objetivo oportunizar a diversificação de cultivos na região, reduzindo a necessidade de aquisição de hortifrutis pelos supermercadistas de centros mais distantes, como CEASA/POA, Serra Gaúcha, entre outros. Além disso, possibilitar aos discentes do curso de Agronomia do Campus a oportunidade de escolha para realizar projetos e atividades práticas relacionadas a um diferente nicho de mercado e trabalho, não tão habitual a localidade onde o Campus está inserido.

A horticultura, compreendida pelas áreas da fruticultura, olericultura, floricultura, plantas medicinas e plantas condimentares, em geral se caracteriza por ser uma atividade rentável, podendo, dessa forma, ser praticada em pequenas áreas com boa remuneração do agricultor e fixação do homem no campo. Esta atividade facilmente se adapta à produção integrada, buscando produtos de qualidade, minimizando riscos ao homem e ao meio ambiente. Dentre os principais alimentos consumidos mundialmente, as frutas e as hortaliças se destacam como importantes fontes de fibras, vitaminas e minerais, importantes para a saúde humana, reduzindo doenças cardiovasculares e mortalidade.

Nesse contexto, o GFIMAH busca trabalhar principalmente com hortaliças e frutíferas, entretanto, com enfoque principal em pequenas frutas. Um dos primeiros projetos foi à implantação da cultura do fisális na região, uma frutífera pertencente ao grupo das pequenas frutas, com o objetivo de avaliar o efeito do espaçamento e do número de hastes, fenologia e comportamento geral frente às condições edáficas e climáticas da região. A produção dessa espécie é pouco explorada, porém oferece boas perspectivas principalmente a produtores familiares devido a seu baixo custo de implantação, adaptação às condições socioeconômicas e alto valor agregado aos produtos finais. Com os trabalhos, foi possível estimar o comportamento e produção da frutífera na região, através de avaliações em relação ao crescimento, ao desenvolvimento, à fenologia e à qualidade pós-colheita. 

Ainda no estudo da introdução e aclimatação de pequenas frutas na região o GFIMAH iniciou em 2019 um projeto de avaliação de diversas cultivares de morangueiros importados do Chile (país destaque no desenvolvimento de novas cultivares de morangos). O pseudofruto (morango) dessa espécie é muito apreciado pelos consumidores e tem excelente mercado. Nesse primeiro ano de estudos foram implantados nove cultivares, quatro de dias curtos e cinco de dias neutros, sendo três cultivares novas e seis cultivares já conhecidas pelos produtores. Essas novas cultivares apresentaram bom potencial de produção, porém ainda serão necessários mais anos de experimentação para uma recomendação mais precisa. Nesse projeto diversos caracteres foram avaliados: qualidade química, física e sensorial das frutas, adaptação das plantas ao sistema de produção no solo, fenologia das diferentes cultivares, entre outros aspectos. Assim como o fisális, o cultivo do morangueiro apresenta-se como uma alternativa rentável aos pequenos produtores da região, sendo de suma importância seu estudo.

Outro trabalhos foram desenvolvidos pelo grupo objetivaram o estudo da propagação de plantas hortícolas, como: 1) avaliação da produção de mudas de Rúculas “Folha Larga” submetidas a diferentes tamanhos de bandejas com diferentes substratos e densidades de semeadura sobre características de desenvolvimento inicial como parte aérea e raiz, essenciais para seu crescimento após o transplante. A cultura da rúcula ainda é predominantemente implantada por meio da semeadura direta a campo. O objetivo da produção de mudas é a aceleração da produção de rúcula; reduzir o tempo de competição com plantas daninhas no canteiro de cultivo e, reduzir o tempo de exposição das plântulas às intempéries que muitas vezes causam a necessidade de ressemeadura. 2) Produção de mudas enxertadas de tomateiro com porta-enxertos resistentes a doenças de solo. A finalidade foi avaliar a eficiência das diferentes técnicas de enxertia (encostia, fenda cheia, inglês simples e inglês complicado) no pegamento do enxerto para produção das mudas. 3) Produção de pepino japonês a partir de mudas produzidas por enxertia de encostia em porta-enxertos de abóboras (‘Keeper’ e ‘Potent’), resistentes a doenças de solo, e abóbora ‘Menina rajada’. 4) Produção de mudas de oliveira ‘Arbequina’ e ‘Arbosana’ por estaquia com uso de ácido indolbutírico ou ácido indolacético, com ou sem ferimento lateral da base da estaca. 

Outros pequenos estudos foram realizados no decorrer desses 2 a 3 anos de existência do GFIMAH, mas sempre com enfoque na horticultura. O objetivo do grupo para os próximos é seguir com estudos na temática das pequenas frutas, repetindo e ajustando experimentos com fisális e morango, mas também iniciar estudos com amora-preta e mirtilo de baixo requerimento de frio hibernal para florescimento.

Apesar do GFIMAH ainda ser relativamente novo no campus está de portas abertas à novos discentes e docentes que possam e queiram colaborar com as pesquisas e que tenham interesse em desenvolver projetos na área de horticultura.

A UNIPAMPA E O DESENVOLVIMENTO DE ITAQUI, UMA REFLEXÃO NECESSÁRIA

Por José Carlos Severo Corrêa, professor adjunto da UNIPAMPA Campus Itaqui,
economista e doutor em Desenvolvimento Regional.

Em outro momento produzimos um texto refletindo o impacto econômico da chegada da UNIPAMPA em Itaqui. Nesse sentido, objetivo deste texto é aprofundar a discussão feita anteriormente fazendo uma reflexão do quanto a UNIPAMPA afetou a economia itaquiense, levando em consideração dados relativos ao Valor Adicionado Bruto (VAB) dos grandes setores da economia de acordo com metodologia oficial.

A UNIPAMPA tem em sua lei de criação e em seu Plano de Desenvolvimento Institucional registrado o seu compromisso com o desenvolvimento regional, no caso a Metade Sul do Rio Grande do Sul. Dado essa manifestação legal e institucional, é que pretendemos refletir em torno disso, especificamente no caso, a questão dita econômica.

Pois bem, mas o que seria o desenvolvimento regional? Nesse caso, nos valemos das palavras de Cardoso (1995, p.1), “nas ciências sociais, os conceitos são historicamente densos [ … ] precisam se redefinir sempre que ocorram alterações de alcance estrutural nas relações sociais”. Dessa forma, tantos quantos conceitos adotarmos seriam aplicáveis; no entanto, vamos nos ater ao conceito de desenvolvimento como sinônimo de liberdade. A liberdade mencionada, nesse caso, diz respeito às questões sociais, ao acesso à educação, à saúde e aos direitos civis, sobretudo participar, escolher e ter acesso. Assim, é necessária a remoção das “fontes de privações de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição social sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência excessiva de Estados repressivos” (SEN, 2000, p.18). Observe-se que há uma pressuposição de que só haverá êxito na empreitada se houver condições básicas para a tal melhoria, referenciada em direitos fundamentais e conhecimento. De forma complementar, Barquero (2001) aborda ser o desenvolvimento um processo combinado entre uma participação ativa dos atores da comunidade envolvida com a forças motrizes externas. Nesse ponto em específico, é que observamos a contribuição da UNIPAMPA para a sua região de abrangência, na qual encontra-se Itaqui.

Como já foi dito anteriormente, nossa reflexão no momento leva em consideração a contribuição para a economia regional, que no caso específico estamos nos atendo à cidade de Itaqui. Assim sendo, para fins metodológicos, vamos nos ater exclusivamente aos dados estatísticos de natureza econômica disponibilizados por organismos oficiais, no caso a Secretaria de Orçamento Planejamento e Gestão do governo do estado. Os dados utilizados são relativos aos valores do Valor Adicionado Bruto (VAB) setorial por intermédio dos quais se calcula o Produto Interno Bruto (PIB) do município. Basicamente são três setores: agropecuária, indústria e serviços, sendo que neste último também são consideradas as informações relativas ao comércio e ao setor público. Além disso, os dados receberam tratamento estatístico simples em planilha eletrônica, sendo considerado o ano 1 da série 2008, ano de instalação da UNIPAMPA no município, e o ano final é 2017, última informação disponível. Essencialmente, foram feitas três análises, a primeira apurou a média anual da participação de cada setor no do VAB gerado no município ao longo da série estudada, a segunda considerou os valores absolutos nominais anuais de cada setor, ou seja, sem nenhum tipo de deflacionamento, e a terceira considerou a variação percentual anual por setor.

Na primeira análise, observamos o comportamento do VAB para a agropecuária, indústria e serviços, no intervalo entre 2008 e 2017 em termos absolutos. Esses são indicadores que demonstram como cada setor da economia de um município ou estado se comportam ao longo do tempo. A soma dos valores adicionados mais os serviços públicos e impostos correspondem ao (PIB), indicador mais conhecido devido a sua divulgação periódica, especialmente, em termos nacionais.

É sabido que o município de Itaqui se notabiliza pela produção agropecuária e indústria de processamento de alimentos, sobretudo arroz; no entanto, mostra-se muito importante para o município o VAB gerado pelos serviços. Na média da série histórica 2008-2017, os serviços corresponderam à 51,7% do total dos VAB’s, como pode ser observado na Figura 1.

Na Figura 2, observa-se a variação do VAB entre os anos de 2008 e 2017, ressalvando que o valor dos serviços engloba também a administração pública, que também está representada no gráfico, para fins de análise do comportamento. Não nos interessa a atualização dos valores, por isso estão em termos nominais, a ideia é observar a tendência de forma comparada. A premissa básica é de que naturalmente em termos nominais os VAB’s deveriam apresentar tendência de crescimento, o que efetivamente se observa. Nitidamente se observa que o crescimento do VAB dos serviços apresenta um crescimento consistente ano a ano, movimento semelhante ao da indústria, o que não ocorre com a agropecuária. Algumas considerações podem ser feitas, o VAB da indústria tem comportamento semelhante ao da administração pública, observe-se que nesse caso a contribuição da UNIPAMPA é contabilizada. Já o VAB da agropecuária é oscilante apresentando movimentos de queda em alguns anos. E por fim o crescimento do VAB dos serviços apresenta um crescimento maior demonstrado principalmente pelo distanciamento observado na comparação com a indústria, embora no ponto de partida os valores estejam próximos, no final da série é evidente que os serviços apresentaram um crescimento mais consistente. Salientamos que embora não seja toda a explicação, a UNIPAMPA contribui de forma bastante importante nesse sentido, pois além dos gastos com a contratação de obras e pessoal, indiretamente toda a rede de prestação de serviços a essa nova comunidade, cerca de 1000 alunos e 170 servidores concursados mais os terceirizados, gera uma movimentação relevante no setor de serviços.

Na Figura 3, os valores foram transformados em índices tomando o ano de 2008 como base = 100, e a sequência com valores relativizados em uma variação percentual ano a ano para cada setor. Salienta-se mais uma vez que nos serviços está incluída a administração pública, mas a mesma também tem seu VAB específico inserido no gráfico, assim como também foi abordado o PIB de Itaqui para a série, como forma de se comparar o crescimento anual de cada variável.

Evidencia-se nesta análise que, embora em termos absolutos haja uma grande diferença, em termos percentuais essa diferença fica menos visível. O VAB que mais cresceu foi o da administração pública, o que fortalece o raciocínio de que a UNIPAMPA tem alta contribuição nesse aspecto. Observa-se que o crescimento dos serviços foi, entre extremos, semelhante ao da indústria, mas essa tem uma oscilação maior, ao passo que aquele mantém-se numa taxa constante de crescimento. Curiosamente, nos primeiros anos a indústria apresentou relação inversa à agropecuária, contrariando o que seria óbvio o acompanhamento de uma e outra dado que são atividades complementares, observado nos anos finais, mas essa é uma análise a ser feita em outro momento. Cabe salientar também que o comportamento da agropecuária, menor taxa de crescimento, foi responsável pelo crescimento do PIB bem abaixo do VAB da administração pública, pois esse na verdade acompanha a média da variação do desempenho de cada setor.

Para finalizar nossa reflexão, podemos elencar algumas considerações:

1) ao contrário do que seria sugerido, o comportamento do VAB da agropecuária e da indústria não são diretamente relacionados, embora haja complementariedade, esse é um elemento que precisa ser melhor estudado.

2) O VAB dos serviços apresentou um crescimento bem acima dos demais em termos absolutos, mas quando comparado em termos percentuais observa-se que esta elevação se deu principalmente por conta da administração pública, na qual também está contabilizado a contribuição da UNIPAMPA ao setor.

3) Essa relativa importância da UNIPAMPA no comportamento do VAB dos serviços poderá ser melhor evidenciada, quando for feita a apuração relativa ao ano de 2019 por conta das questões relacionadas a dificuldades orçamentárias já mencionadas anteriormente.

4) Fica também para outro momento a observação do impacto da pandemia no município de Itaqui, que deverá ser importante a exemplo do estado e mesmo do país.

Concluindo, podemos dizer que embora relevante para o desempenho econômico do município, há outros elementos que evidenciam a importância da UNIPAMPA tanto para Itaqui como para a Fronteira Oeste e a Metade Sul do Rio Grande do Sul, assuntos que deveremos abordar em outro momento. Registramos também, a necessidade de explorarmos mais as diversas facetas do conceito de desenvolvimento, que como já dito é denso e moldado pelas transformações estruturais.

REFERÊNCIAS E SUGESTÕES DE LEITURA

BARQUERO, A. V. Desenvolvimento endógeno em tempos de globalização. Porto Alegre; FEE, 2001.
CARDOSO, F. H. Desenvolvimento: o mais político dos temas econômicos, 1995.
Revista de Economia Política. São Paulo, v.15, n.4. out-nov. 1995. Disponível em <http://www.rep.org.br/pdf/60-11.pdf> Acesso em 05 nov 2016.
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria de Orçamento Planejamento e Gestão. Departamento de Economia e Estatística.
PIB Municipal, série histórica. Disponível em: <https://dee.rs.gov.br/pib-municipa>. Acesso em 10 abr 2020.
SEN, A. K.
Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

Às compras com Carrinho Cego

Por Gabriel Vicente de Oliveira,
revisão e edição de Walker Douglas Pincerati

Como uma pessoa com deficiência visual, ou outro tipo de deficiência, realiza suas atividades mais simples, como ir a um mercado? Aliffer Matzenbacher e eu, Gabriel Vicente de Oliveira, alunos do SENAC de Itaqui/RS, se puseram essa pergunta e lançaram o Carrinho Cego, em inglês: Blind Cart. Como funciona esse Carrinho? 

Nós colocamos num carrinho de mercado uma antena e 4 (quatro) sensores ultrassônicos. Antena e sensores são ligados por cabos a uma placa de computador, uma placa de programação chamada Arduino, que funcionará como o cérebro do Carrinho. Com os sensores, o carrinho ganha olhos porque eles lançam ondas ultrassônicas que se espalham no espaço, batem em todos os objetos nele contidos num ângulo de 300 graus e retornam aos sensores, gerando uma espécie de “campo de visão” (ver Esquema). Esse equipamento possibilita com o carrinho “veja” e perceba tudo o que está no espaço ao redor, facilitando assim a locomoção da pessoa que o empurra. É assim que o carrinho se localiza no espaço e guia essa pessoa.

Esquema do funcionamento dos sensores
Esquema do funcionamento dos sensores

 

Localizado no espaço, o Carrinho precisa identificar os produtos nele disponíveis e onde está no espaço. Ele faz isso com sua antena. A antena, com frequência RFID, também ligada à Arduino (ver Figura 1), detecta e lê as etiquetas que estão nos produtos comercializados pelo mercado. Assim que o Carrinho Cego passa, ele lê as características básicas e o preço do produto detectado pela antena; bem como em que sessão do mercado a pessoa está e por que prateleira ou estante ela está passando. Essa leitura é vocalizada, tal como faz um rádio. Essa voz é, então, escutada via fones de ouvido pela pessoa que empurra o carrinho. Desse modo, o Carrinho Cego vê e ouve o que está disposto no mercado para a pessoa, facilitando assim suas compras à medida que anda pelo estabelecimento.

Isso tudo é possível porque o Carrinho Cego tem uma espécie de memória, a NodeMCU. Trata-se de um aplicativo, um Banco de Dados que armazena e processa todos os dados coletados pelos sensores do Carrinho, cruzando-os com os dados disponíveis na internet. Essa tecnologia é conhecida como Internet das Coisas. Os dados que estão na internet são

exatamente as informações que o Carrinho lê nas etiquetas dos produtos. O mercado deve então alimentar bem o Banco de Dados.

Figura 1: Arduino e Sensor Ultrassônico
Figura 1: Arduino e Sensor Ultrassônico Fonte: Autor 2020

 

Aliffer e eu, antes de tudo, entrevistamos deficientes visuais de Itaqui e detectamos haver uma enorme falta de estrutura a deficientes na cidade. Ao darmos continuidade à pesquisa, descobrimos que o público a ser atendido pelo Carrinho é enorme. Atualmente, o projeto está sob os auspícios do SENA/C Itaqui.

O projeto Blindo Cart foi desenvolvido no 1º (primeiro) semestre de 2019. Concebido, no início, como um simples projeto voltado ao comércio, numa das aulas do Senac, recebeu a Primeiro Prêmio no X SENAC 2019, grande feira de tecnologia do Rio Grande do Sul. O projeto gerou demandas tecnológicas que resultaram parcerias com o SESI Paraná e com ITAG Etiquetas, a maior empresa de etiquetas de rádio frequência RFID do Brasil.

Em 2019, após o X SENAC o trabalho foi apresentado na UNIPAMPA Itaqui pelos alunos do Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, Gabriel Vicente de Oliveira e Márcia Brites, sob a supervisão do professor Paulo Siqueira, dessa Universidade. Desde então, o projeto tem cada vez ganhado visibilidade e tem aberto novas perspectivas à acessibilidade das pessoas com deficiência visual.

Gabriel Vicente de Oliveira é discente da Universidade Federal do Pampa em Bacharelado Interdisciplinar Ciência e Tecnologia, no campus Itaqui/RS. Trabalha no ramo de Cooperativas, busca a união da tecnologia com a gestão de pessoas. Defendeu o projeto Blind Cart em Porto Alegre/RS, no dia 26 de setembro de 2019, para 5 (cinco) avaliadores, sob a orientação de Loreni Ceretta Bernardes, e o auxílio de Aliffer Matzenbacher.

Um pouco sobre minha trajetória profissional….

Silvana Peterini Boeira, professora adjunta do curso de Nutrição, Unipampa – Campus Itaqui
Email:
silvanaboeira@unipampa.edu.br

Buenas….fiquei pensando em como iniciar esse texto e como boa educação manda me apresento aqui: Sou a professora Silvana do campus Itaqui, prazer! Falar da minha trajetória profissional me remonta uma série de memórias e muita nostalgia…me formei em Farmácia na Universidade Federal de Santa Maria no ano de 2008 (estou ficando velha…kkk) e uma semana após a formatura já estava trabalhando. Comecei como farmacêutica da Rede Panvel de Farmácias e como Bioquímica de um Laboratório de Análises Clínicas da cidade de Itaqui. Foram 4 anos de muito aprendizado e de aceitar as dificuldades da profissão…nem tudo são flores quando está iniciando e se inserindo no mercado de trabalho. Nesse meio tempo surge a primeira seleção para o mestrado em bioquímica do Programa de Pós Graduação em Bioquímica do campus Uruguaiana e eu sou aprovada. Sob a orientação da professora Ana Flávia Furian (hoje na UFSM) desenvolvi pesquisa analisando os efeitos deletérios da micotoxina Zearalenona (ZEA) em roedores e em um ano já era mestre e aprovada no doutorado na UFSM. Foi tudo muito rápido e lembro até hoje dos experimentos que ocorreram no campus Itaqui na sala 205 e das ligações diárias para a reitoria da Unipampa a fim de saber se o papel moeda havia chegado para a diplomação do mestrado (afinal, eu fui a primeira mestre da Unipampa). O fato é que o doutorado passou voando com 3 anos de idas e vindas na ponte Itaqui-Santa Maria, afinal, eu trabalhava ainda como bioquímica e residia em Itaqui. Mantive a mesma linha de pesquisa do mestrado apenas introduzindo o licopeno como alternativa terapêutica aos efeitos nocivos da ZEA já conhecidos e me formei doutora em Farmacologia pelo  Programa de Pós Graduação em Farmacologia da Universidade Federal de Santa Maria. Vale ressaltar que ainda no doutorado eu prestei concurso para professor substituto de bioquímica na Unipampa Campus Itaqui e fui aprovada. Considero esse período da minha vida profissional como um dos mais desafiadores e o que mais trabalhei, visto que mantinha o doutorado, as aulas como professora substituta (que não foi fácil) e o trabalho externo em laboratório. E após o doc?? Meio ano após o doutorado eis que surge uma vaga no campus Itaqui para ministrar disciplinas da área básica para o curso de nutrição. O pós-doc ainda não era um objetivo até porque queria me estabilizar profissionalmente e garantir uma vaga como professora universitária. Fui aprovada em primeiro lugar e assim, me tornei oficialmente uma professora universitária efetiva!! Apesar de já ter experiência na docência, em função de ter sido substituta, foi um grande desafio ministrar aulas de anatomia, parasitologia, imunologia, fisiologia e farmacologia (ciências tão diferentes mas ao mesmo tempo tão próximas) para turmas com média de 35 alunos…que na anatomia chegou a 60 alunos! Além das aulas, como desenvolvi minha pesquisa de mestrado e doutorado no grupo de pesquisa LAFTAMBIO PAMPA (Laboratório de Análises Farmacológicas e Toxicológicas de Produtos Naturais e Sintéticos do Pampa) ingressei ao mesmo como professora pesquisadora desenvolvendo projetos envolvendo substâncias naturais e sintéticas em roedores, principalmente, em modelos de patologias diversas. Com esses projetos vários trabalhos de conclusão de curso foram defendidos, bem como, uma dissertação de mestrado e duas de doutorado em andamento. Na área da extensão desenvolvi 3 projetos em que destaco o projeto Sarau Contemporâneo que têm feito sucesso e integração entre os alunos. Por fim, na área do ensino sempre registrei monitorias dos componentes curriculares de imunologia e anatomia e atualmente registrei o projeto “Oficinas de Técnicas/Modelagens Experimentais” que visa fomentar a iniciação científica através de práticas de ensino em laboratório. Deixo aqui o link do meu currículo lattes (Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4052693245472353) eespero que tenham gostado da minha história! Nem sempre é fácil e rápido, mas a gente chega lá…escuta o que tô dizendo!! Bjss

Dedico esse texto ao meu querido Cristiano Ricardo Jesse que sempre me inspirou e continua me inspirando…

Projeto “Meninas nas Ciências”

Por Caroline Jaskulski Rupp e Caroline Raquel Bender.

A desigualdade de gênero na área de Ciências é um tema que, infelizmente, transpassa em nossos dias atuais. Segundo dados da UNESCO sobre os grupos que formam as comunidades científicas, as mulheres representam apenas 30% dessa população total. Se analisarmos as publicações científicas, temos que 60% do total publicado são de pesquisadores do sexo masculino. Considerando ainda os laureados pelo prêmio Nobel (prêmio de reconhecimento internacional por pesquisas ou descobertas notáveis para a humanidade) temos que apenas 5% dos laureados são mulheres.

No Brasil, os dados apresentados pela Academia Brasileira de Ciências não são diferentes dos apresentados pela UNESCO a nível mundial. Nas áreas das Exatas e Tecnologias observamos a predominância de pesquisadores do sexo masculino, refletindo o caráter da desigualdade de gênero. Dessa forma, quando pensamos em um projeto como o “Meninas nas Ciências” estamos tentando, mesmo que a passos lentos, mudar esse cenário de desigualdade de gênero nas Ciências para os próximos anos.

Quando visitamos espaços fora do ambiente acadêmico, em sua maioria, escolas, tentamos utilizar metodologias alternativas e dinâmicas educacionais diferentes daquelas utilizadas pelos professores no período normal de aula, de forma a promover a interação dos alunos com a Ciência e com questões de desigualdade de gênero. Podemos destacar o uso de oficinas com experimentos científicos, seminários, simulações computacionais e ainda a aplicação de questionários como forma de avaliação dos conhecimentos prévios dos alunos sobre Ciência. Em todas essas atividades, buscamos estabelecer um vínculo dos alunos com a Ciência e mostrar a importância das universidades públicas no contexto de possibilidade de acesso a uma carreira científica.

As atividades do projeto são realizadas mensalmente, em diferentes instituições e em diferentes turmas de alunos, com uma faixa etária que varia de 06 a 18 anos. Em todas as atividades, realizamos um experimento científico que envolve Ciência e também um seminário em que abordamos dados sobre a desigualdade de gênero e exemplos de mulheres historicamente relevantes para o desenvolvimento científico e social. A primeira atividade realizada em 2019 foi a Oficina de Perfumes no Instituto Estadual de Educação Osvaldo Cruz, quando as alunas aprenderam sobre de Química envolvida na elaboração de perfumes e a Física das embalagens e, então, produziram o seu próprio perfume. Uma outra atividade desenvolvida foi na EEEF Roque Degrazia. Os alunos assistiram um seminário sobre o projeto e, então, realizaram um experimento que produzia chuva ácida, com o intuito de desenvolver conhecimento sobre a importância das pesquisas científicas para detectar e amenizar esse problema. Também realizamos diversas atividades na Escola José Gonçalves da Luz onde aplicamos, entre muitos, um experimento didático sobre viscosidade que envolvia conceitos de Química e Física sobre as propriedades dos líquidos.

No atual cenário em que nos encontramos no ano de 2020 (pandemia de Covid-19), as atividades do projeto nos meses de abril e maio foram voltadas para a produção de sabonetes líquidos. Foram produzidos 18 litros de sabonete líquido que foram distribuídos às instituições do município de Itaqui (Lar do Idoso, APAE e o CRAS). Essa atividade bem como outras ações desenvolvidas pela UNIPAMPA, neste cenário, servem para demonstrar a importância da ciência, da força feminina e da universidade pública no enfrentamento à Covid-19.

Membros do Projeto: Caroline Raquel Bender (Coordenadora); Integrantes: Elaine Fortes, Caroline Jaskulski Rupp, Bruna Zambrano dos Santos, Milena Matos Azevedo, Augusto Freitas, Andreia Maria Sousa Freitas, Milenne Baltazar de Almeida Bolanho, Michele Carrard, Gabriel Ramos Porfirio, Darlian Souza Quintero.

Referências e sugestões de leitura

Academia Brasileira de Ciências – 2016 – Disponível em: http://www.abc.org.br/ FEENEY – Mary K. Feeney – Por que tão poucas mulheres ganharam prêmios Nobel de ciência? – 2019 – Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/ – Acesso em: 07 de maio de 2020.

Organização das Nações Unidas Brasil – Desigualdades de gênero afastam mulheres e meninas da ciência, dizem especialistas – 2019 – Disponível em: https://nacoesunidas.org – Acesso em: 04 de maio de 2020.

Redação Galileu – Mulheres são maioria na ciência, mas apenas 23% têm cargos de influência – 2019 – Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/ – Acesso em: 03 de maio de 2020.

SILVEIRA – Aline Reinhardt da Silveira – Campus Itaqui produz 18 litros de sabonete líquido para doação – 2020 – Disponível em: https://unipampa.edu.br/portal/ – Acesso em: 07 de maio de 2020.