Estamos cruzando a ponte. Mas o que isso quer dizer? Quer dizer que a travessia é esse imenso caminho chamado revolução feminista. E a nossa luta, materializada no Grupo Feminista Momento Delas – com objetivo teórico, acadêmico, afetivo e solidário – é a nossa ferramenta de poder. Nosso núcleo é formado por 12 pessoas, atualmente. Pesquisadoras, Docentes, Discentes, Advogada, Jornalista, Bacharel em Ciência e Tecnologia. É nessa multiplicidade de vivências que chegamos aqui, nesse espaço de construção e reconstrução epistemológica do feminismo e suas vertentes para conhecer, debater e produzir conhecimento científico.
Com isso, não ignoramos as nossas experiências pessoais. A cada percepção do machismo cotidiano, a cada tentativa de silenciamento, a cada apagamento e a cada assédio sofrido ou presenciado, estamos tomando consciência das injustiças no que diz respeito ao gênero. Constituídas como grupo, em nosso lugar de pesquisadoras e ativistas, estamos situadas dentro de um movimento intelectual e político no campo de um dos mais importantes movimentos sociais do século XX que é o feminismo. Nessa linha de pensamento, as teóricas feministas trazem para nós a dimensão do cotidiano – as diferentes experiências das mulheres, com suas histórias de vida marcadas pelos seus lugares no mundo.
Simone de Beauvoir, Judith Butler, Rebecca Solnit, Márcia Tiburi, Chimamanda Ngozi Adichie, entre outras, mulheres, pesquisadoras, intelectuais, teóricas que compuseram nossas principais referências ao longo deste ano. Embora marcado pelo distanciamento social, o ano de 2020, para o Momento dElas, foi de aproximação – mesmo que virtual–. Desde o início desse ano, promovemos reuniões em grupo, reunião com os poderes legislativo e judiciário, em Itaqui, com intuito de sugerir políticas públicas voltadas às mulheres, produção de artigos científicos e capítulo de livro e, por fim, ampliamos nossa rede virtual e, agora, juntamente com os demais campi da Unipampa, montamos um grupo de partilha de saberes – com estudo de livros, documentários, podcast etc.
O Momento dElas surgiu a partir do Grupo de Estudos #HeForShe, projeto de extensão vinculado à Comissão de Gênero e Sexualidade da Unipampa, Campus Itaqui, e ao Grupo CNPq de Pesquisa e Extensão Cultura, Linguagem, Sociedade e Educação. Atualmente, o projeto conta com três bolsas vinculadas ao Programa de Fomento à Extensão. O objetivo do grupo é proporcionar palestras e debates criando um ambiente em que a comunidade acadêmica discute com a comunidade externa assuntos relacionados a gênero e à violência contra a mulher em apoio à Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e Empoderamento das Mulheres.
Nosso próximo passo, já iniciado este ano, é contribuir com o Projeto CiênciAcão, por meio do CiênciAção Mulher, espaço destinado a divulgar a produção científica do grupo Momento dElas, mas, sobretudo, ser um local de acolhimento de relatos de mulheres que tenham sido desrespeitadas, violadas, violentadas em espaços institucionais, como a Universidade.
Nosso lema para hoje e para sempre: Ouça as mulheres!
O CiênciAção: Observatório Interdisciplinar de Divulgação Científica e Cultural apresenta sua 8ª edição. A seção Observatório traz exemplos de ações desenvolvidas na UNIPAMPA voltadas à popularização da ciência. São divulgados os projetos Matemática das Epidemias, que tem como objetivo elaborar material didático informativo contemplando o papel da Matemática na luta contra pandemias, e o projeto Programa C – Comunidade, Computação, Cultura, Comunicação, Ciência, Cidadania, Criatividade, Colaboração, registrado no campus de Alegrete, que busca ampliar o espaço da sala de aula, organizando ambientes de aprendizagem significativos, interdisciplinares e interprofissionais.
A seção Reportagens traz o texto Colhe Arroz: contribuição da UNIPAMPA aos Orizicultores da região, uma contribuição do Laboratório de Sistemas Inteligentes e Modelagem (LabSIM) da UNIPAMPA Itaqui. Discorre sobre um aplicativo, que se chama Colhe Arroz, desenvolvido para servir de instrumento a profissionais com atuação na assistência técnica junto à produção de arroz, a fim de possibilitar-lhes aumentar a eficácia da sua colheita.
Com o propósito de mostrar as pessoas por trás dos projetos, O Professor Nota 10 da vez é César Alberto Ranquetat Júnior, do campus de Itaqui. Em numa entrevista online gravada e conduzida pela acadêmica do Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, Pamela Piardi de Almeida, ele conta sobre a sua trajetória acadêmica e profissional, com significativa produção. Kalita Maieski Leal Fresingheli apresenta-se em Meu TrabalhoNota 10, que fala sobre a importância das abelhas no meio ambiente. Ela conta sobre a construção de seu trabalho de conclusão de curso. E, por fim, na seção Alun@ destaque, Alison Fernando Jeronymo escreve sobre suas experiências acadêmicas no curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia. Fahrenheit 451, romance distópico de Ray Brandbury, é o livro constante em Convite a Leituras. Na seção Artigo de opinião, Eduardo Vieira da Silva escreve sobre a crise da democracia representativa em Tecnopopulismo: a influência dos algoritmos na política. Em Blog e Colunista, Walker Douglas Pincerati escreve uma Carta em resposta a Carta de Paulo Freire aos Professores (1993 [2001]), em que relata sobre suas experiências de leituras e escrita a partir da leitura da carta de Paulo. Esta edição termina com os poemas Despedida – Ida – Caminhada – Chegada de Pamela Piardi, na seção Artes e Cultura.
A equipe do CienciAção deseja uma excelente leitura a tod@s!
As abelhas desempenham um papel fundamental na reprodução das plantas, pois realizam a polinização e deste modo são um dos principais meios de perpetuação da flora e fauna silvestre. É indispensável a conscientização da relevância das abelhas no contexto econômico, social e ambiental. Por esse motivo, esse tema deve ser utilizado como parte da educação ambiental nas escolas buscando abranger a mudança de hábitos em relação às abelhas. O presente trabalho tem como objetivo conscientizar sobre a relevância das abelhas e sua contribuição para o meio ambiente, utilizando da educação ambiental como ferramenta, em escolas do município de Itaqui/RS. A atividade de educação ambiental foi realizada em duas escolas estaduais do município de Itaqui, em turmas do 3º ao 5º ano do ensino fundamental. O trabalho foi dividido em duas etapas: na primeira etapa, em sala de aula, foi aplicado questionário com a finalidade de registrar as noções básicas dos alunos com relação ao tema proposto. Na segunda etapa, no pátio da escola, realizou-se a apresentação do tema sobre as abelhas com e sem ferrão, sua origem, quais os produtos produzidos pelas mesmas, sua importância e sobre a “morte das abelhas devido ao uso indiscriminado de agrotóxicos”. Os resultados do questionário mostraram que para os alunos a importância das abelhas seria a produção do mel (30% das respostas), produção de remédio (27%) e polinização (4%), dentre outras. Além disso, mostraram desconhecimento com relação à existência de abelhas sem ferrão e sobre o real comportamento desses insetos. Entretanto, com a apresentação do tema, os alunos demonstraram interesse, questionando e participando das atividades. Assim, compreenderam a importância das abelhas na polinização e o que isso influencia na manutenção da flora e fauna silvestre local. Conclui-se que o objetivo do trabalho foi alcançado, pois os alunos compreenderam a relevância das abelhas e sua contribuição com o ecossistema, e certamente levarão as informações recebidas para seus familiares.
Veja o vídeo aqui:
Kalita Fresingheli tem 21 anos e é discente do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia da Unipampa, campus Itaqui. Contato: kafresingheli@gmail.com .
Na entrevista concedida para discente Pamela Piardi, Cesar Alberto Ranquetat Júnior, conta que é docente da Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, e fala sobre sua trajetória acadêmica. Destaca que sempre teve interesse pela área das Ciências Humanas e ressaltou que esse interesse veio graças o pai. Ele fala também sobre suas inspirações e sobre seu processo de escrita.
Cesar é formado em Direito na Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter. Fez alguns semestres no curso de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e, por motivos profissionais, não conseguiu concluir o curso. Fez mestrado em Sociologia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUC/RS e o doutorado em Antropologia na UFRGS. Em 2018, fez pós-doutorado na área de Teoria Política na Espanha, em Madrid. Interesse-se por estudo e pesquisas diretamente relacionados às Ciências Sociais, principalmente Antropologia da Religião, Sociologia Política e Teoria Social. Publicou Laicidade à brasileira: Um estudo sobre a controvérsia em torno da presença de símbolos religiosos em espaços públicos (2012), Da direita moderna à direita tradicional (2019) e Ensaios antimodernos (2020).
Talvez, como muitas outras pessoas, eu não conheço a obra de Paulo Freire e por isso não me atrevo a falar sobre ela. Qualquer opinião nesse sentido seria um preconceito. E como não gosto de ser preconceituoso, procuro – muitas vezes sem sucesso – não falar sobre aquilo que não sei. E por isso não falava de Paulo Freire. No entanto, um dia uma conversa me deixou curioso porque soube, por uma amiga, que, no fim da sua obra, ele apostou na carta como um poderoso instrumento de práticas de leitura e escrita para todos nós. Vou então, a partir de agora, contar brevemente uma experiência de leituras causada pela leitura da Carta do Paulo. Após ler a carta dele, não tive como não escrever esta, que agora você lê. Em sua leitura, clique nas imagens e nos links para acessar os textos, os vídeos (mais essencialmente) e outras informações. Espero que goste desta carta!
Confesso que eu nunca tinha parado para ler e terminar de ler um texto de Paulo Freire. Eu, obviamente, havia escutado falar muito dele, de sua Pedagogia do Oprimido e da Pedagogia da Esperança; mas nunca consegui lê-lo. Lembro-me que até tentei uma vez ler…, acho que a Pedagogia do Oprimido durante minha graduação em Linguística na UNICAMP. Mas parei. Creio eu que parei porque seu texto é bem diferente dos textos que estava acostumado a ler, impregnados pela metodologia do texto científico e universitário. Por isso, não suportei – se sou fiel ao que senti – à leitura à época.
A leitura da Carta me veio de uma forma desviada – o que me faz lembrar da frase que diz que “toda carta chega a seu destino”. No dia em que assinei o contrato de união estável, a e os testemunhas jantamos no Sinuelo, um restaurante bem bom de Jaguarão/RS. Sentei-me ao lado da Ana Cristina da Silva Rodrigues e ela me contou do projeto e grupo de estudos que está levando a cabo sobre “as cartas pedagógicas” e que trabalhar com essas cartas têm feito com que suas orientandas se sintam mais soltas para escrever. Comentei com ela que achava isso muito interessante porque – lembrei-me – em minha adolescência eu escrevi muitas cartas. Eu me correspondia via “carta social” com pessoas do Brasil inteiro. Era uma alegria ver o carteiro chegar com aquele pacote grande cheio de cartas. E que, pensando hoje nisso, isso foi super importante para mim e para minha formação. Lamentei que as cartas que envio hoje não são mais respondidas, que as pessoas não sentam e param para escrever cartas!! Também comentei – se me recordo bem – o quanto Freud, o pai da Psicanálise, escrevia e trocava correspondências com várias pessoas e intelectuais; algumas delas muito famosas, como a famosa troca de cartas entre Albert Einstein e Freud, publicadas sob o título: Por que a Guerra? Einstein escreve pro Freud perguntando por que acontece a guerra? E Freud responde… texto disponível aqui (entre as páginas 21 e 47.) Eu disse para Ana que, a meu ver, a Psicanálise foi edificada nas cartas. Ela então me convidou para conhecer o grupo das cartas pedagógicas e participar de uma reunião. Combinamos isso e ela ficou de me mandar uma carta de Paulo Freire e umas cartas de suas alunas. Nada de preparação, mas sim uma conversa livre. Dias depois recebi pelo whats algumas cartas de três alunas e a Carta de Paulo Freire aos professores, publicada em 1993 e republicada em 2001, chamada Ensinar, aprender: leitura do mundo, leitura da palavra. Você pode ler a carta clicando aqui. Ela também é encontrada no livro do Paulo Freire: Professora, sim; tia, não – Cartas a quem ousa ensinar.
Antes de participar da reunião e após ter lido a carta, assisti novamente a dois filmes de uma série do Netflix que eu gosto muito porque me emociono muito. Violet Evergarden Especial e, depois Violet Evergarden Gaiden, sendo que este eu não sabia que já estava disponível. Se você gosta de anime ou não se irrita de ver um desenho, vale a pena assistir este pequeno trecho do Especial, momento em que uma carta de Violeta – uma jovem que fora treinada para ser uma arma de guerra, perdeu seu amor e suas mãos na guerra e se tornou uma Boneca de Automemória, uma escritora-fantasma, profissional que escreve carta para seus clientes. A carta é lida e cantada num musical. Vale a pena ver o trecho:
Violet Evergarden é uma série japonesa adaptada para anime, originada de uma série de light novel (novela ou romance rápido) japonesa, escrita por Kanan Akatsuki e ilustrada por Akiko Takase. O filme Gaiden dessa série, o último que saiu no Netflix, caiu como uma luva depois de ler a carta do Paulo Freire como uma carta pra mim, um professor.
O filme começa com uma criança num navio com uma carta na mão…
Na primeira parte da história, a pedido da Família Real, Violeta vai trabalhar como professora de cultura, conversação, etiqueta e dança da jovem Isabella York. Isabella é uma jovem que se sente aprisionada e solitária numa instituição destinada exclusivamente e integralmente à criação das meninas das boas famílias, suas criadas e professores. Uma escola de meninas separadas do mundo por muros altos. Todas as meninas vêm de famílias respeitáveis ou se casarão com alguém respeitável. Após alguns dias de convivência, Isabella pergunta para Violeta que tipos de cartas já escreveu. Violeta responde dizendo que “cartas permitem você expressar o que normalmente não pode dizer” – pela beleza, vale a pena ver o trecho:
Comprido o propósito, Violeta se despede de Isabella. Na despedida, Isabella disse que sente muitas saudades de Taylor, sua irmãzinha com quem convivera quando era uma mendiga e se chamava Amy. Violeta se oferece para escrever uma carta da Isabella para Taylor e repete seu maior ensinamento: uma carta lhe permite expressar seus sentimentos. Veja o trecho:
A segunda parte da história começa com Taylor chegando na empresa que a Violeta trabalha. Toda contente, afirma que quer ser uma entregadora de cartas, um carteiro. Depois de um dia de trabalho, em que Violeta sai pela cidade para entrega cartas com ela, ao mesmo tempo em que a ensina ler e escrever, Violeta pergunta para Taylor porque ela quer ser um carteiro? A graciosa garotinha conta que quando era pequenininha, seu “professor” – o carteiro da empresa – chegou e entregou uma carta de sua irmã para ela. Que isso fez com que ela se lembrasse dos momentos felizes que viveu com ela. Ele deu isto para ela: entregou para ela a felicidade. “Também quero entregar felicidade!”, disse então Taylor. Violeta pede para ajudar Taylor a escrever uma carta para sua irmã, expressando o que sente. Elas passam a noite escrevendo e precisam que a carta chegue a seu destino, o que é um grande desafio. Então, pedem isso ao carteiro, o professor de Taylor, que responde que “toda carta deve chegar a seu destino”. Eis as duas partes em que isso acontece:
Escrever cartas permite expressar aquilo que não podemos dizer, permitem expressar os sentimentos. E entregar cartas é entregar felicidade. Sempre há um difícil ato de doação nisso, uma doação que implica em transformação sem esperar recebe algo imediato em troca. Porém, algo que se dá na troca, e assim toda carta chega a se destino…
Ler a Carta de Paulo Freire me despertou um sentimento de descoberta e de satisfação com o modo mesmo que ele escreve, tudo junto. Pois ele “teoriza” sem precisar de muita referenciação sobre o ato de ensinar e aprender como um ato duplo: ensinar é aprender. Mais ainda, que “ensinar ensina o ensinante a ensinar”, considerando que o professor é sempre um aprendiz: ele tem que sempre estudar! É então que passa a discorrer sobre o estudo, sobre a posição crítica no ato de estudar enquanto ato de ler e de escrever; e que na prática de tais atos necessitamos usar os instrumentos pedagógicos e linguísticos disponíveis: os dicionários, as enciclopédias, outros textos, etc. “Estudar é desocultar, é ganhar a compreensão mais exata do objeto, é perceber sua relação com outros objetos. Implica que o estudioso, sujeito do estudo, se arrisque, se aventure, sem o que não cria nem recria.” (p.264.)
Ele escreve isso após discorrer sobre a experiência em Porto Mont. Experiência em que determinados conceitos-chave só seriam discutidos na prática em que as pessoas ali presentes se engajavam. Isso fez com que a “leitura” que as pessoas daquele lugar faziam de seu próprio lugar mudasse a partir de um “distanciamento crítico”. Além da “leitura do mundo”, passaram ao nível de uma “leitura do mundo” pela “leitura da palavra”. O exercício com a palavra pela palavra transformou a visão que tinham do próprio lugar. É a questão, a posição crítica do ato de estudar como prática inerente à profissão do professor que provoca a reflexão, a leitura e a escrita como “processos que não se podem separar.” Essa separação é um equívoco, e, neste ponto lembro da Taylor com Violeta: aprendeu a ler na rua porque queria entregar cartas e aprendeu a escrever para escrever cartas.
Paulo Freire entende que se desde a pré-escola essa prática dupla “ler e escrever” acontecesse, não haveria pós-graduandos dizendo hoje que não sabem escrever (p.266). E então avança numa proposta de considerarmos o corpo como um “vir sendo”, e não como um “vir a ser” e sempre sendo infante: ‘que não fala’, ‘incapaz de falar’, ‘criança’. Ou seja, não tratar as crianças e os outros em geral como infantes, falados, tomar-lhes a palavra; e não os tratar como falantes, recusando em dar-lhes a palavra. O falante, leitor e “escritor”, é então entendido enquanto corpo que se apropria criticamente de “sua forma de vir sendo” que faz parte de sua natureza, constituindo-se histórica e socialmente. O uso do gerúndio por Paulo marca o processo, não seu fim. Portanto, é uma escrita que faz questão de mostrar que somos seres de linguagem, que nossa percepção, nosso corpo se transforma à medida que falamos, lemos e escrevemos; e, em suma, estudamos.
Me surpreendeu em tudo isso a relação oralidade e escrita, quando diz que, embora a oralidade preceda a escrita, ela “a traz em si desde o primeiro momento em que os seres humanos se tornaram socialmente capazes de ir exprimindo-se através de símbolos que diziam algo de seus sonhos, de seus medos, de sua experiência social, de suas esperanças, de suas práticas.” (p.266.) Ou seja, um ponto de vista que entende a escrita como simbolização gráfica da experiência e como construtora mesma desta experiência.
Termino por dizer que eu gosto disso tudo, mas que também me é difícil pensar nisso tudo. Nós, como professores, temos medo de parecermos burros, de errar, de não saber e de reconhecer isso e nos doar. Justifique-se o que se queira justificar! Mas é somente no ato de se doar que nossa profissão faz sentido, dá esperança e nos move a sempre mais buscar. Se escrever uma carta é também se doar, posso talvez dizer que professar é também amar.
Agradecimentos especiais ao Clito Lagoeiro, meu grande amigo que me ajudou na edição e disponibilização dos vídeos. Os créditos das cenas recordadas devem ser atribuídos inteiramente aos produtores do filme Violet Evergarden Gaiden, dirigido por Haruka Fujita (2019, 1h30, HD, 5.1).
por Patrícia Yukari Sato Rampazo,
Alisson Darós Santos, Francisco Carlos
Caramello Junior e Sandra Machado de Souza Lima
O projeto Matemática das Epidemias visa à elaboração de material didático informativo contemplando o papel da Matemática na luta contra pandemias. O material é distribuído digitalmente e com linguagem acessível.
A mudança relativamente brusca que a humanidade experimentou em seu modo de vida com o advento da agricultura e da civilização — passando de pequenos grupos nômades de caçadores e coletores a grandes aglomerados em cidades — foi acompanhada do surgimento de inúmeras doenças com impacto desastroso, as chamadas epidemias (Soares, 2001). Segundo a Organização Mundial de Saúde, a palavra pandemia é usada para caracterizar uma determinada doença que se espalhou rapidamente por diversas partes de diversas regiões (continental ou mundial) através de uma contaminação sustentada. Frente a esse novo fenômeno, surgiu também a ideia de se utilizar a matemática para melhor entender as potencialidades de disseminação, e as características de doenças pandêmicas. Isso originou uma nova área dentro da matemática, chamada de Epidemiologia Matemática (Yang, 2001).
O projeto conta com uma equipe formada por professores da Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, campus Itaqui; Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC; e Universidade Federal Fluminense – UFF, campus Pádua. O projeto Matemática das Epidemias tem como objetivo principal divulgar conhecimentos básicos da epidemiologia matemática, apresentando modelos matemátic0-os para cenários como o da COVID-19 e as principais ferramentas matemáticas que esses modelos utilizam. Prioriza-se a linguagem simples, intuitiva e, portanto, mais acessível ao grande público.
O projeto se insere não só no atual contexto de pandemia como também no de valorização da cultura digital no ensino e divulgação de ciência, hoje ainda mais potencializado pela necessidade de isolamento social por conta da pandemia. Também nesta temática, observa-se a escalada das notícias e informações falsas, as chamadas fake news, que estão sendo disseminadas e dificultam o entendimento da sociedade com relação a esse assunto e outros temas também importantes. Observa-se também a dificuldade de se divulgar resultados científicos, por geralmente serem de natureza altamente técnica, o que também contribui com a desinformação e pode levar o público à indiferença ou até mesmo a descrença quanto à gravidade dos problemas como a atual pandemia.
O acesso a informações claras, simples, de qualidade e oriundas de fontes confiáveis se faz, então, cada vez mais necessário. Nesse contexto, o projeto elucida, apresenta e divulga modelos matemáticos, gráficos, estatísticas e outras informações, na forma de posts nas redes sociais como o Instagram, pelo perfil @matematicadasepidemias; o Facebook, pela página Matemática das Epidemias e, também, pelo site oficial do projeto, no endereço: http://cursos.unipampa.edu.br/cursos/licenciaturaemmatematicaitaqui/matematica-das-epidemias.
Espera-se, assim, contribuir um pouco com a desmistificação do senso comum de que a matemática é um assunto intrincado e inacessível, e também colaborar com a compreensão do presente quadro epidemiológico da COVID-19.
Referências Bibliográficas:
SOARES, C. D. Modelagem Matemática de Doenças Infecciosas Considerando Heregeneidade Etária: Estudo de Caso de Rubéola no México. Tese (Mestrado em Matemática Aplicada). Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, São Paulo, 2011. YANG, H. M. Epidemiologia Matemática – Estudos dos Efeitos da Vacinação em Doenças de Transmissão Direta. [S.l.]: EDUNICAMP & FAPESP, 2001.
O Laboratório de Sistemas Inteligentes e Modelagem (LabSIM) da UNIPAMPA Campus de Itaqui desenvolveu um aplicativo denominado Colhe Arroz, visando fornecer um instrumento para que os profissionais com atuação na assistência técnica junto à produção de Arroz e aos Orizicultores possam aumentar a eficácia da Colheita do arroz. Segundo o coordenador do LabSIM, professor Alexandre Russini, Eng. Agrônomo, mestre e doutor em Engenharia Agrícola, o aplicativo objetiva facilitar o “planejamento da colheita, estimativa de perdas em função das condições de operação e determinação do custo horário das colhedoras”.
O aplicativo foi desenvolvido a partir do projeto de extensão “Determinação do Custo Horário da Colheita Mecanizada de Arroz Irrigado na Fronteira Oeste do RS”, em que a equipe do LabSIM obteve dados de campo fornecidos pelos produtores de Arroz Irrigado, através de visitas às lavouras, possibilitando constituir um aplicativo com base em condições reais de operação. As planilhas com dados de campo foram confrontadas com equações conhecidas da literatura e referências obtidas em pesquisas sobre operação de máquinas agrícolas, permitindo a criação de um aplicativo de caráter prático e funcional.
Deve-se destacar que o Colhe Arroz poderá contribuir na orientação das regulagens das máquinas, reduzindo as perdas de grãos o que significa um grande problema enfrentado pelos produtores.
O coordenador do projeto destaca a interdisciplinaridade no trabalho do LabSIM porque envolvendo a ciência da computação, a mecanização agrícola e a ciência agronômica, qualificando as ações de pesquisa, extensão e ensino, as quais são realizadas de forma integrada.
O aplicativo já está disponível gratuitamente nas plataformas GooglePlay e AppStore, sendo possível obter-se download no endereço: http://labsim.unipampa.edu.br/colhearroz/
A equipe envolvida no projeto é constituída, além do coordenador do LabSIM, pelos professores Cristiano Galafassi e Rogério Rodrigues de Vargas; e os discentes Daniel Ciro de Souza (formado no Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, agora discente do segundo ciclo do curso de Agronomia), Cezar Vinicius Lago Halim (do curso de Agronomia) e Luis David de Nazaré Martins (do curso de Engenharia de Agrimensura).
A crise da democracia representativa é tema recorrente de livros sobre política mundo a fora. Analisando o desalento e a revolta da população com as instituições (MOUNK, 2018) ou como regimes democráticos podem sucumbir não por golpes, mas por processos graduais de centralização de poder (LEVITSKY & ZIBLATT, 2018), cientistas sociais buscam encontrar respostas para entender o avanço de líderes populistas.
Invariavelmente, um dos pontos elencados são as mudanças tecnológicas, que explicam em parte o problema. As insatisfações humanas já estavam aí, porém precisavam ser estimuladas. O casamento entre a cólera de uma população descontente com os efeitos da globalização (por razões justas ou não) e os sofisticados algoritmos das redes sociais produziram o que está sendo chamado de “tecnopopulismo” (EMPOLI, 2019).
Experiências como o Movimento 5 Estrelas, na Itália, demonstram que as agendas políticas estão sendo substituídas por qualquer ideia que mantenha o eleitor colado nas plataformas. Quanto mais radicais e apelativas forem as mensagens – pouco importa se factuais –, mais impacto terão para gerar emoções e engajar os apoiadores. Por trás desse projeto político, estrategistas usam os dados dos usuários para construir uma argumentação personalizada que os atraia e conquiste. É o que Giuliano da Empoli chama de “os engenheiros do caos”.
No Brasil, a eleição presidencial de 2018 passou também pelo modo como foi utilizado o aplicativo WhatsApp (MELLO, 2020), com denúncias de doações de campanha não declaradas por parte de empresas e por disparos em massa. A “Máquina do Ódio” valeu-se, sobretudo, do medo e da indignação dos eleitores. Com um discurso extremista e com o uso de fake news – notificas falsas –, a moderação sumiu do debate, polarizado entre radicais.
Portanto, é fundamental que os democratas encontrem formas de frear o avanço de populistas e seus engenheiros do caos, que utilizam novos meios para ascender ao poder e depois enfraquecer as instituições.
Referências Bibliográficas:
MOUNK, Yascha. O povo contra a democracia: por que nossa liberdade corre perigo e como salvá-la. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.
LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
EMPOLI, Giuliano da. Os engenheiros do caos: como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. São Paulo: Editora Vestígio, 2019.
MELLO, Patrícia Campos. A máquina do ódio: notas de uma repórter sobre fake news e violência digital. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
Residências equipadas com múltiplas telas destinadas ao entretenimento e à interação entre fornecedores de conteúdo e usuários. Diálogos em famílias inexistentes ou superficiais. Relações humanas fragmentadas pelo aparato tecnológico. Aversão à leitura. A criminalização “do porte e da posse de livros”, com a destruição massiva de tão poderosos e perigosos artefatos. Esse é o tema da obra Fahrenheit 451, romance distópico publicado pela primeira vez no ano de 1953.
Duas adaptações foram realizadas para o cinema: uma de 1966, dirigida pelo francês François Truffaut (Reino Unido/França, colorido, 1h52min) – clique aqui para ver o trailer ou clique aquipara saber mais – e a outra adaptação foi lançada em 2018, produzida nos EUA e dirigida por Ramin Bahrani (100min) – clique aqui para ver o trailer.
Ray Bradbury conta em Fahrenheit 451 a história do bombeiro Guy Montag. Guy levava uma vida “normal” até ser confrontado com as ideias e pensamentos de uma jovem “desajustada”, passando inesperadamente a questionar todo o sistema de caça aos livros. Percebeu que o sistema ditava o modo como as pessoas deveriam falar, pensar e agir. Que a determinação de eliminar eles – queimá-los – queria manter essa ordem a todo custo como a verdadeira e a boa para todos. Se a leitura de livros liberta os pensamentos, dever-se-ia então considerá-los altamente perigosos!
Embora seja uma ficção, quase 70 anos depois da sua primeira publicação, conseguimos nele pensar muito na realidade dos nossos dias. A distopia descrita por Bradbury é atual e perturbadora. Pode ser percebida na exposição do indivíduo nas redes sociais e no seu distanciamento cada vez maior à efetiva leitura. As redes, em pouco tempo, assumiram um papel central na vida de muitos, dominando relações, impondo práticas e costumes, aproximando os que estão distantes e distanciando quem está próximo ou próxima.
Creio que quanto mais o ser humano se vê compelido a consumir e a produzir conteúdos digitais para ser visto e se sentir aceito nesse meio, menos ele pensa por si próprio e reflete sobre suas relações com o planeta e o sistema. Acaba por se tornar um produto das redes que tanto cultiva. Nesse ponto, vejo muito da distopia de Fahrenheit 451 hoje: o apagamento da subjetividade, da crítica da verdade e do sujeito.